Back
Trabalhos publicados como capítulo de livro pela editora Agron Food Academy

COMPOSIÇÃO NUTRICIONAL E BIOATIVA E PROPRIEDADES FUNCIONAIS DO LEITE ASININO: UMA REVISÃO

Laíza Soliely Costa Gonçalves1; Catiele Silva de Oliveira2; Amanda Marilia da Silva Sant’Ana3

1Mestranda do Programa de Pós-graduação em Tecnologia Agroalimentar – CCHSA – UFPB; E-mail:  [email protected], 2 Graduanda do Curso de Bacharelado em Agroindústria – CCHSA – UFPB; E-mail: [email protected], 3 Docente do DGTA – UFPB. E-mail: [email protected].

Resumo: O leite asinino está atraindo cada vez mais o interesse no campo da nutrição devido à sua semelhança com o leite humano, com diversos benefícios à saúde. Ele tem se mostrado uma alternativa ao leite de ruminantes para pessoas com alergia à proteína do leite de vaca, devido ao baixo conteúdo de proteínas potencialmente alergênicas, o que confere hipoalergenicidade e maior digestibilidade ao leite. Apresenta em sua composição um teor de lactose, proteína, e minerais semelhantes ao humano, contudo, o percentual de gordura é bastante inferior. Possui atividade antioxidante, antimicrobiana, antitumoral, antiviral, anti-inflamatória e regula a microbiota gastrointestinal. Os benefícios do leite asinino são diversos, podendo contribuir para os efeitos funcionais, principalmente em relação a questões inflamatórias e restauração da microbiota. Assim, o leite asinino apresenta propriedades nutricionais e promotoras de saúde, além de ser associado como um substituto do consumo ao leite de outros animais, principalmente bovino. O objetivo desta revisão é destacar a composição nutricional e bioativa e as propriedades funcionais do leite asinino em comparação com outros tipos de leite, enfatizando os benefícios de seu consumo à saúde humana.

Palavras–chave: leite; jumenta; saúde; funcionalidade.

INTRODUÇÃO

O asno (Equus asinus), é um membro domesticado pertencente à família Equidae, a qual contém os cavalos e zebras, e são provenientes de duas subespécies de asnos selvagens africanos (E. africanus), e espalharam-se ao longo dos séculos na Ásia, Índia, América do Sul e Europa (ASPRI et al., 2017). Na antiguidade, a utilização desses animais serviu de forma essencial e cultural para o trabalho tracionado, devido a sua rusticidade. No Brasil, os asnos sempre desempenharam um papel fundamental nas atividades rurais, seja por sua força e habilidade para trabalhar, seja por sua facilidade de adaptação e resistência a condições adversas (LARA et al., 2015). Porém seu emprego não foi só como animal de tração e outros usos incluem: a utilização do leite na nutrição humana e na indústria cosmética, produção de carne (muito limitada em alguns países), onoterapia e fins recreativos como equitação e ecoturismo (ASPRI et al., 2017).

O leite asinino era bastante consumido na Roma antiga, pois além de ser considerado um elixir da juventude, possuía um potencial medicinal, indicado como remédio, utilizado principalmente como um produto terapêutico para idosos enfermos e crianças (SALIMEI; FANTUZ, 2012; MARTINI et al., 2018). O leite fornece ao corpo nutrientes que desempenham um importante papel na nutrição e saúde humana (ASPRI et al., 2017). No entanto, o aumento de número de pessoas com intolerâncias e alergias associadas ao consumo de leite de vaca (MARTINI et al., 2018), tem levado à crescente busca por alternativas que sejam ao mesmo tempo nutritivas, saborosas e com propriedades funcionais que auxiliem na manutenção da saúde e prevenção de doenças. As propriedades do leite asinino podem ser mais estudadas para que se permita a sua utilização na indústria terapêutica e estética (MEDHAMMAR et al., 2012; SANTOS, 2017). Assim, o objetivo deste estudo é realizar uma revisão de literatura sobre a composição nutricional e bioativa e as propriedades funcionais do leite asinino em comparação com outros tipos de leite, enfatizando os benefícios de seu consumo à saúde humana, para aprofundar o conhecimento sobre esse leite e estimular novos estudos que ampliem as perspectivas de utilização do leite asinino.

COMPOSIÇÃO QUÍMICA DO LEITE ASININO EM COMPARAÇÃO COM OUTROS LEITES

A composição do leite asinino (proteína do soro de leite, lactose e caseínas) é semelhante à do leite humano e difere do leite de outros animais produtores de leite (por exemplo, vaca, búfalo, ovelha e cabra) (ASPRI et al., 2017; DERDAK et al., 2020). Apresenta como fração de caseína predominante a β-caseína, assim como no leite humano, que pode representar até 80% do total de caseínas (CUNSOLO et al., 2017), sendo esse conteúdo muito inferior ao do leite de vaca (ASPRI et al., 2017) (Quadro 1). Além disso, o leite de jumenta se caracteriza por possuir alto teor de lactose e baixo teor de cinzas. O conteúdo de lactose, que é em torno de 5,4 a 7,4%, o torna ainda mais semelhante ao leite humano, e é responsável pelo sabor adocicado e boa palatabilidade (CUNSOLO et al., 2017; MARTINI et al., 2018). O teor de minerais como sódio, zinco e manganês, são relatados como similares ao leite humano, enquanto os macrominerais (cálcio, potássio, fósforo, magnésio) é observado em maior quantidade do que no leite humano, mas seus teores são inferiores aos encontrados no leite de ruminantes (FANTUZ et al. 2012; FANTUZ et al. 2013).

Quadro 1 – Composição do leite de diferentes espécies.

aAdaptado de Guo et al. (2007); Polidori et al. (2009); Salimei et al. (2004); Altomonte et al. (2019); Vincenzetti et al. (2017).

A grande diferença entre o leite de asinino e o leite humano é no teor de gordura, que é muito inferior no leite de jumenta (DERDAK et al., 2020), resultando em menor valor energético. A composição dos lipídeos do leite depende das necessidades energéticas e das características nutricionais, genéticas e de lactação da espécie animal e eles são importantes como fonte de ácidos graxos essenciais, como ácido linoleico e linolênico, e vitaminas lipossolúveis como A, D, K e E (VINCENZETTI et al., 2017).  Essas características da composição química do leite asinino têm impacto na sua aceitação sensorial, principalmente pelo público infantil, por possuir alto teor de lactose. O menor teor de caseínas o tornando mais digerível para a crianças (MARTINI et al., 2018) e como forma de compensar o baixo conteúdo lipídico, alguns pediatras sugerem a adição de óleos no leite (SWAR et al., 2011).

PROPRIEDADES FUNCIONAIS E BIOATIVAS DO LEITE ASININO

Devido a presença de componentes bioativos na composição leite asinino (lisozima, lactoferrina, ácidos graxos, peptídeos, imunoglobulinas, entre outros), algumas propriedades funcionais são atribuídas ao leite, tais como atividade antimicrobiana, imunomoduladora, hipoalergenicidade) (ASPRI et al., 2017). O maior conteúdo maior de ácidos graxos polinsaturados e menor de ácidos saturados quando comparado com o leite de ruminantes (CLAYES et al., 2014), são fundamentais para prevenção da obesidade e doenças crônicas não-transmissíveis (MARTINI et al., 2015). A lactose, que existe em grande quantidade no leite asinino, auxilia na prevenção da osteoporose, pois é responsável pela melhor absorção intestinal de cálcio e fósforo, que é essencial para a mineralização óssea (ASPRI et al., 2017). O baixo conteúdo de proteínas potencialmente alergênicas, confere hipoalergenicidade e maior digestibilidade ao leite asinino (BARNI et al., 2018), podendo ser uma alternativa adequada para crianças que sofrem de alergia à proteína do leite de vaca, como estudado por Sarti et al 2019, que avaliaram a capacidade do leite de jumenta de controlar a “síndrome de enterocolite induzida por proteínas alimentares” causada pelo leite de vaca. A alta quantidade lisozima, atua na redução da incidência de infecções gastrointestinais no trato digestivo (COSENTINO et al., 2015), pois é uma enzima que exerce um papel na resposta imunológica intestinal e atua como agente antimicrobiano natural, além de regular a microbiota intestinal e prevenir doenças inflamatórias e autoimunes (BRUMINI et al., 2016). Outra enzima muito presente no leite asinino, a lactoferrina, apresenta ação antimicrobiana, antiviral, propriedades antifúngicas, anti-inflamatórias e antitumoral (FARNAUD; EVANS, 2003). Brumini et al. (2013) demonstraram que o leite asinino possui atividade antiviral, devido às proteínas do soro de leite de alto peso molecular, como lactoferrina, Lipoxigenase e imunoglobulina, que apresentaram capacidade de inibir a replicação de um enterovírus que afeta o trato gastrointestinal humano. O leite asinino também demonstrou efeito antiinflamatório, em modelo animal de doença de Crohn (YVON et al., 2018). Trinchese et al. (2015) demonstraram um efeito hipolipêmico deste leite, capaz de influenciar a homeostase metabólica e o estado inflamatório, modulando a composição microbiana intestinal. Tastekin et al. (2018) observaram que a mucosa gástrica de ratos com dano e inflamação foi protegida devido às funções anti-inflamatórias e antioxidantes do leite asinino. Percebe-se o importante potencial do leite asinino para a saúde humana, devido as diversas propriedades funcionais e bioativas atribuídas aos seus constituintes.

CONCLUSÕES

As propriedades funcionais e a composição nutricional e bioativa do leite asinino são comparáveis ​​às do leite humano. As perspectivas de utilização do leite asinino podem ser ampliadas com outros estudos que avaliem as potencialidades do leite asinino como alimento e seus benefícios à saúde humana, principalmente do leite produzido por animais criados no Brasil.

REFERÊNCIAS

ALTOMONTE, I. et a. Donkey and human milk: Insights into their compositional similarities. International Dairy Journal, v. 89, p. 111-118, 2019.

ASPRI, M. et al. Donkey milk: An overview on functionality, technology, and future prospects. Food Reviews International, v. 33, p. 316-333, 2017.

BARNI, S. et al. Tolerability and palarability of donkey’s milk in children with cow’s milk allergy. Pediatric Allergy & Immunology, v. 29, p. 329-331, 2018.

BRUMINI, D. et al. Antiviral activity of donkey milk protein fractions on echovirus type

5. International Dairy Journal, v. 28, p. 109-111, 2013.

BRUMINI, D. et al. Whey proteins and their antimicrobial properties in donkey milk: a brief review. Dairy Science & Technology, v. 96, p. 1–14, 2016.

CLAYES, W. L. et al. Consumption of raw or heated milk from different species:an evaluation of the nutritional and potential health benefits. Food Control, v. 42, 2014.

COSENTINO, C. et al. Effect of jenny milk addition on the inhibition of late blowing in

semihard cheese. J. Dairy Sci., v. 98, n. 8, p. 5133-5142, 2015.

CUNSOLO, V. et al. Proteins and bioactive peptides from donkey milk: The molecular basis for its reduced allergenic properties. Food Res. International, v. 99, p. 41-57, 2017.

DERDAK, R. et al. Donkey Milk Bioactive Proteins and Peptides, Health and Food Applications – A review. Preprints.org; 2020. DOI: 10.20944/preprints202007.0119.v1.

FANTUZ, F., et al. Essential trace elements in milk and blood serum of lactating donkeys as affected by lactation stage and dietary. Animal, v. 7, p. 1893-1899, 2013.

FANTUZ, F. et al. Donkey milk concentration of calcium, phosphorus, potassium, sodium and magnesium.  International Dairy Journal, v. 24, p. 143-145, 2012.

FARNAUD, S., EVANS, R. W. Lactoferrin: a multifunctional protein with antimicrobial properties. Molecular Immunology, v. 40, n. 7, p. 395–405, 2003.

GUO, H. et al. Composition, physiochemical properties, nitrogen fraction distribution, and amino acid profile of donkey milk. J. Dairy Sci. v. 90, n. 4, p. 1635-1643, 2007.

LARA, M. A. C. et al. Genetic diversity of asse’s five populations through the use of microsatellites markers. Arch. Latinoame. Produc. Anim., v. 23, n. 3-4, p. 85-88, 2015.

MARTINI, M. et al. Changes in donkey milk lipids in relation to season and lactation. Journal of Food Composition and Analysis, v. 41, p. 30-34, 2015.

MARTINI, M. et al. Nutricional e Nutracêutico Qualidade do leite de burro. Journal of Equine Veterinary Science, v. 65, p. 33-37, 2018.

MEDHAMMAR, E. et al. Composition of milk from minor dairy animals and buffalo breeds: a biodiversity perspective. Journal Science Food Agriculture, 2012.

POLIDORI, P. et al. Donkey milk production. Ital. J. Anim. Sci. v. 8, p. 677-683, 2009.

SALIMEI, E. et al. Composition and characteristics of ass’s milk. Anim. Res., v. 53, p. 67-78, 2004.

SALIMEI, E.; FANTUZ, F. Equid milk for human consumption. International Dairy Journal, v. 24, p. 130-142, 2012.

SANTOS, I. C. B. Produção e Composição do Leite de Jumentas da Raça Pêga. (Mestrado em Produção de monogástricos) – UFBA -BA, 48p, 2017.

SWAR, M. O. Donkey milk-based fórmula: A substitute for patiens with ow’s milk protein allergy. Sudanese Journal of Paediatrics, v. 11, n. 2, p. 21-24, 2011.

TASTEKIN, E. et al. Indomethacin-induced gastric damage in rats and the protective effect of donkey milk. Archives of Medical Science, v. 3, p. 671-678, 2018.

TRINCHESE, G. et al. Human, donkey and cow milk differently affects energy efficiency and inflammatory state by modulating mitochondrial function and gut microbiota. Journal of Nutritional Biochemistry, v. 26, n. 11, p. 1136-46, 2015.

VINCENZETTI, S. et al. Role of proteins and of some bioactive peptides on the nutritional quality of donkey milk. Beverages, v. 3, p.1-20, 2017.

YVON, S. et al. Donkey milk consumption exerts anti-inflammatory properties by normalizing antimicrobial peptides levels in Paneth’s cells in a model of ileitis in  mice. Eur J Nutr, v. 57, p. 155-166, 2018.

//
//
Jaelyson Max
Atendimento Agron

Me envie sua dúvida ou problema, estou aqui para te ajudar!

Atendimento 100% humanizado!