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A IMPORTÂNCIA DAS BOAS PRÁTICAS DE MANIPULAÇÃO DE ALIMENTOS NO CONTROLE DE MICRORGANISMOS CAUSADORES DE DOENÇAS: REVISÃO DE LITERATURA

Capítulo de livro publicado no livro da III Semana Nacional da Microbiologia de Alimentos na Indústria. Para acessa-lo  clique aqui.

DOI: https://doi.org/10.53934/IIISEMICRO-13

Este trabalho foi escrito por:

Jéssica Débora de Souza Davi *; Amanda Henrique da Costa Bento  ; Lídia Rejane da Silva Macedo

*Autor correspondente (Corresponding author) – Email: [email protected]

Resumo: Nos dias atuais, devido a mudança do estilo de vida das pessoas, a busca por alimentação fora de casa tem aumentado. Com isso, se faz necessário que os restaurantes adotem práticas que tornem essas refeições seguras para os clientes. Sendo assim, este trabalho tem como objetivo descrever e analisar as produções científicas sobre a atual situação dos restaurantes em relação às Boas Práticas de Manipulação (BPM). O estudo foi realizado por meio de revisão bibliográfica de artigos dos últimos 5 anos, utilizando as bases de dados LILACS, PUBMED e SCIELO. Foram selecionados 10 artigos que preencheram todos os critérios de inclusão. Como observado, os restaurantes têm adotado nos últimos anos às BPM, contribuindo para o controle dos microrganismos causadores de doenças, porém é necessário aprimorar ainda mais os aspectos higiênicos. Sendo assim, é importante que os estabelecimentos produtores de refeições possam assegurar uma higiene sanitária apropriada e treinamento em BPM para os manipuladores de alimentos, com o intuito de prevenir o surgimento de doenças, oferecendo alimentos seguros para os consumidores.

Palavras–chave: boas práticas; higiene; segurança alimentar; serviços de alimentação

Abstract: Nowadays, due to the change in people’s lifestyle, the search for food away from home has increased. Thus, it is necessary for restaurants to adopt practices that make these meals safe for customers. Therefore, this work aims to describe and analyze the scientific productions on the current situation of restaurants in relation to Good Handling Practices (GMP). The study was carried out through a bibliographic review of articles from the last 5 years, using LILACS, PUBMED and SCIELO databases. Ten articles that met all inclusion criteria were selected. As noted, restaurants have adopted BPM in recent years, guaranteed to control disease-causing microorganisms, but it is necessary to improve even more the hygienic aspects. Therefore, it is important that food producing establishments can ensure proper sanitary hygiene and GMP training for food handlers, in order to prevent diseases, and provide safe food for consumers.

Keywords: good habits; hygiene; food security; food services

INTRODUÇÃO

            Com a mudança no estilo de vida das pessoas, a frequência do consumo de refeições fora de casa aumentou nos últimos anos, consequentemente, elevou-se a demanda dos restaurantes e lanchonetes. O estabelecimento por sua vez necessita garantir ao seu cliente a execução das Boas Práticas de Manipulação (BPM) desde a produção da matéria-prima até o seu consumo, seguindo todas as legislações e normas técnicas aplicadas aos serviços de alimentação (1).

No Brasil, houve nos últimos anos um aumento do número de restaurantes, sendo que em 2021, o setor de alimentação coletiva forneceu cerca de 35,5 milhões de refeições/dia, movimentando uma cifra de 19,3 bilhões de reais por ano. Este contexto revela ainda mais a importância dos meios de controle por parte dos estabelecimentos, a fim de possibilitar a oferta de alimentos seguros, que não causem Doenças Transmitidas por Alimentos (DTAs) (2).

Segundo a RDC 216/04 (3), entende-se como agentes contaminantes “substâncias ou agentes de origem biológica, química ou física, estranhos ao alimento, que sejam considerados nocivos à saúde humana ou que comprometam a sua integridade”.

De acordo com dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN), entre os anos de 2012 a 2021 foram notificados um total 6.347 surtos de DTA’s, o que representa uma média anual de cerca de 705 casos, para o número de doentes há uma média de quase 12 mil pessoas e cerca de aproximadamente 10 óbitos (4).

As práticas inadequadas de higiene e a manipulação de alimentos por pessoas inabilitadas estão entre as principais causas para a ocorrência das DTAs. A manipulação inadequada dos alimentos pode estar relacionada a 97% dos casos de doenças transmitidas por alimentos associadas a restaurantes. Com isso, têm-se que os cuidados higiênicos no processo de produção e a capacitação dos manipuladores de alimentos são fatores cruciais para a prevenção da ocorrência de DTA’s (5).

Conseguinte, os estabelecimentos que mantém seus manipuladores capacitados e treinados oferecem menos risco de contaminação de alimentos, pois quando se tem manipuladores conscientes sobre as BPM, essa conscientização refletirá na qualidade e segurança das refeições. Treinar, capacitar e orientar os manipuladores de alimentos sobre os cuidados na aquisição, armazenamento, manipulação, higiene e exposição à venda é de grande valor e de suma importância para o estabelecimento do ramo alimentício, além de propiciar uma maior qualidade dos serviços prestados aos clientes dos restaurantes.

Diante da importância do tema para a saúde coletiva, este trabalho propõe verificar na literatura a situação atual dos restaurantes em relação às Boas Práticas de Manipulação de Alimentos (BPM) e sua importância para o controle de microrganismos causadores de doenças.

MATERIAL E MÉTODOS

Atualmente, com os avanços tecnológicos, fomentado também pela quantidade de novos estudos científicos que surgem a cada dia, a pesquisa bibliográfica tem se tornado uma nova ferramenta nas chamadas bases de dados. Por meio da busca de estudos já elaborados, a revisão bibliográfica tem objetivo de impulsionar o aprendizado, amadurecendo os conhecimentos pré-existentes levando em consideração suas dimensões, avanços e novas descobertas nas diferentes áreas do conhecimento (6).

O estudo foi realizado por meio de buscas online de produções científicas nacionais e internacionais a respeito das Boas Práticas de Manipulação (BPM) em restaurantes, nas bases de dados: SCIELO – Scientific Electronic, LILACS – Library Online, Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde e  PubMed: MEDLINE® Retrieval on the World Wide Web Fact Sheet, no período de fevereiro a abril de 2023, tendo como questão norteadora se às boas práticas garantem a proteção dos alimentos e consequentemente dos consumidores em relação aos microrganismos causadores de doença.

Para isso, foram utilizados como critérios de inclusão artigos publicados no período de 2017 a 2022, completos, nos idiomas português, espanhol e inglês. Foram excluídos do estudo dissertações, teses, monografias, revisões, bem como artigos científicos repetidos, tendo como base de busca as seguintes palavras-chave: restaurantes, boas práticas e higiene de alimentos. Foi realizada a leitura dos resumos dos artigos onde foram excluídos aqueles que não atendiam ao objetivo do estudo. Após avaliação, foram excluídas 3.557 publicações, e identificados 10 artigos que preencheram todos os critérios (Figura 1).

Após a leitura dos resumos, foram selecionados 18 artigos para leitura na íntegra. Depois de serem analisados, 10 artigos foram selecionados de acordo com os critérios deste estudo. Os demais foram excluídos devido não estarem dentro dos critérios de inclusão.

No Quadro 1 podemos observar os artigos estudados, sintetizados entre seus títulos, autores, ano de publicação e objetivos, com o intuito de trazer uma maior clareza em relação às informações citadas. Pode-se também verificar a distribuição dos estudos de acordo com o ano de publicação, com maior ocorrência no ano de 2021 (30%), seguido de 2017 (30%), 2020 (20%), 2019 e 2018 (10% cada ano).

Por meio da análise dos artigos selecionados, foi possível verificar que os trabalhos são de diversos periódicos científicos. Foi possível observar que quando aplicadas de forma correta pelos colaboradores, às Boas Práticas de Manipulação são bastante eficazes no combate a contaminação dos alimentos. De modo geral, verifica-se que nos últimos anos os restaurantes necessitam ainda mais de instruções relacionadas às boas práticas. Isso também ressalta a importância de profissionais especializados nesses locais, tais como técnicos e tecnólogos de alimentos, engenheiros de alimentos, nutricionistas, entre outros profissionais responsáveis por avaliar se as práticas de higiene estão sendo executadas corretamente nos estabelecimentos.

Santos et. al. (7), em um estudo observacional em um restaurante de Foz de Iguaçu-PR, observaram o comportamento dos colaboradores durante a manipulação dos alimentos. Diversas vezes foi visto a utilização de objetos pessoais em cima de bancadas, assim como na área de produção, como por exemplo o celular, considerado uma fonte de alto risco de contaminação. Além disso, ressaltaram a possibilidade de que os manipuladores de alimentos podem ser uma possível fonte de contaminação, por meio das mãos mal higienizadas. Tais atitudes podem levar a contaminação dos alimentos por alguns microrganismos que colocam em risco a segurança alimentar, como por exemplo, o Staphylococcus aureus, Encherichia coli, Bacillus cereus e Pseudomonas aeruginosa, que podem ser transferidos para os alimentos.

Em um estudo de caso, Araújo (8) mostrou por meio de análise microbiológica que superfícies de uma área de produção de alimentos encontravam em condições higiênicas insatisfatórias, no qual verificou-se a presença de microrganismos, dentre eles, fungos. A higiene inadequada e falta de conservação de equipamentos favorecem o acúmulo de matéria orgânica e consequentemente o crescimento microbiano. Realizar treinamentos em boas práticas para os colaboradores torna-se um método preventivo, responsável por impedir tais situações indesejadas (9).

Uma pesquisa realizada com restaurantes comerciais e institucionais da cidade de Salvador-BA para a avaliação microbiológica das mãos de manipuladores, verificou-se que as amostras obtidas no ramo institucional apresentaram maior percentual de contaminação (73,4%) por S. aureus que os comerciais (33,3%). Tal análise revela a deficiência na higienização das mãos que pode acarretar também na contaminação dos alimentos produzidos (10).

Resultados semelhantes aos de Medeiros, Carvalho e Franco (11) que, em uma pesquisa bacteriológica nas mãos e equipamentos de proteção individual de manipuladores em um restaurante do Rio de Janeiro, obtiveram 61,36% de resultados positivos para coliformes, Staphylococcus coagulase positiva e bactérias heterotróficas aeróbias mesófilas. Em relação aos utensílios, 25% dos resultados foram positivos para as bactérias pesquisadas, demonstrando que o serviço possui falhas, com riscos à saúde do consumidor.

Avaliando as condições higiênico-sanitárias, em três restaurantes tipo self-service no município de Santa Maria-RS, Giuliani et. al. (12) constataram que dentre os os itens Edificação, instalações, equipamentos e utensílios; Higienização de instalações, equipamentos, móveis e utensílios; Controle integrado de pragas; Abastecimento de água; Manejo de resíduos; Manipuladores; Matérias-primas, ingredientes e embalagens e Preparação do alimento, o que obteve maior índice de inadequação foi “Manipuladores”, apresentando classificações entre péssimo e ruim, não estando conforme a legislação.

Um estudo transversal de caráter descritivo e exploratório, em que foram levantadas as conformidades e não conformidades, em relação às BPM de alimentos realizado por Lachno et. al. (13) em serviços de alimentação no município de Santa Rosa-RS, após aplicação de check-list, evidenciou que apenas 56,8% dos itens analisados se mostraram em conformidade com a legislação. A não conformidade de acordo com as normas estabelecidas na legislação contribui para uma baixa qualidade higiênico-sanitária dos alimentos produzidos, o que sugere que os estabelecimentos invistam em treinamentos e medidas para a correção dessas falhas.

Tais achados demonstram a importância da implantação das boas práticas em restaurantes para o controle higiênico-sanitário, e consequentemente a segurança dos alimentos. Para Belphman e Szczerepa (14), a adequação do Manual de Boas Práticas (MBP) e os Procedimentos Operacionais Padronizados (POP) em serviços de alimentação, são importantes para garantir as condições higiênico-sanitárias de preparo do alimento.

Para Dias e Santos (15), o treinamento em Boas Práticas de Manipulação é o ponto de partida para proprietários e manipuladores de alimentos, de estabelecimentos produtores de alimentos com o propósito de preservar a saúde do consumidor e a manutenção do estabelecimento no mercado. Além disso, ações higiênicas relacionadas à manipulação e distribuição de alimentos, devem ser reforçadas para prevenir e controlar a propagação de microrganismos causadores de doenças, evidenciando que BPM devem ser inseridas no cotidiano de quem prepara refeições.

Outro ponto importante a ser evidenciado é a importância de profissionais que fiscalizem o cumprimento das normas sanitárias nesses estabelecimentos. Um estudo realizado em restaurantes comerciais da região central de São José, Santa Catarina-SC, mostrou que de sete restaurantes pesquisados, apenas dois contavam com a presença de profissionais responsáveis por essa fiscalização, sendo que o percentual de adequação das duas unidades referentes a legislação após a aplicação de check-list foi de 90% e 96,6%, estando dentro das normas, diferentemente daqueles locais que não apresentavam profissionais (16).

CONCLUSÕES

De acordo com os resultados encontrados, é evidente a importância da aplicação das Boas Práticas de Manipulação (BPM) em restaurantes, usando métodos adequados de higienização, além do treinamento de colaboradores com o objetivo de garantir a qualidade das refeições para os consumidores, evitando assim a propagação de doenças decorrentes de alimentos contaminados por microrganismos. Além disso, se faz importante a utilização de meios que garantam a qualidade dos alimentos que estão sendo servidos, com o auxílio da supervisão de profissionais, tais como técnicos, tecnólogos e engenheiros de alimentos e nutricionistas, que irão verificar o cumprimento das normas sanitárias vigentes.

Pode-se concluir que um treinamento em boas práticas para produção deverá ser ponto de partida para proprietários e manipuladores de alimentos, tendo em vista que os mesmos são responsáveis por higienizar corretamente os insumos que serão base para o preparo das refeições. Sendo assim, a realização periódica de treinamentos em BPM para os colaboradores é de suma importância para evitar a contaminação cruzada e propagação de microrganismos causadores de doenças, e assim preservar a saúde do consumidor e a manutenção do estabelecimento no mercado.

REFERÊNCIAS

  1. Dias RMF, Santos ICB. Aplicação das boas práticas em restaurantes e lanchonetes localizados em instituições de ensino superior de Salvador, BA. Hig Alimet. 2017;31(270/271):40-44.
  2. Aberc. História e mercado [Internet]. 2021 [acesso em 2023 Abr 26]. Disponível em: https://www.aberc.com.br/historia-e-mercado/.
  3. Brasil. RDC 216, de 15 de Setembro de 2004. Estabelece procedimentos de boas práticas para serviço de alimentação, garantindo as condições higiênico-sanitárias do alimento preparado. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 17 setembro de 2004.
  4. Ministério da Saúde (BR). Sistema de Informação de Agravos de Notificação. Surtos de Doenças de Transmissão Hídrica e Alimentar no Brasil: informe 2022 [Internet]. 2022. [acesso em 2023 Maio 03]. Disponível em: https://shre.ink/Q9Be.
  5. Aguiar OB, Kraemer FB. Educação formal, informal e não-formal na qualificação profissional dos trabalhadores de alimentação coletiva. Nutrire. 2010;35(3):87-96.
  6. Brito APG, Oliveira GS, Silva AS. A importância da pesquisa bibliográfica no desenvolvimento de pesquisas qualitativas na área de educação. Cad da Funcamp. 2021;20(44):1–15.
  7. Santos JAR, Ordoñez AM, Souza IF, Arcanjo FM, Nascimento CRB. Mapeamento dos processos de Boas Práticas na Manipulação de alimentos com ênfase na redução de custos, qualidade e segurança alimentar em um restaurante de Foz do Iguaçu/PR. Demetra: Ali, Nutri & Saúd. 2020;1(10):1-13.
  8. Araújo CL. Avaliação dos procedimentos de limpeza e desinfecção das superfícies de uma unidade centralizada de produção. Reva Bras de Agrotec. 2021;11(2):493–497.
  9. Santos AO, Sampaio ANCE, Martins OA, Pinto JPAN, Pereira JG. Avaliação da contaminação de equipamentos, utensílios e mãos de manipuladores de um serviço de nutrição e dietética. Arch of Vet Sci. 2020;25(3):74-84.
  10. Silva RNA, Santos APL, Soares LS. Avaliação microbiológica das mãos de manipuladores em restaurantes comerciais e institucionais da cidade de Salvador, BA / Microbiological evaluation of the hands of manipulators in commercial and institutional restaurants in the city of Salvador, BA. Hig Aliment. 2017;31(270/271):103-108.
  11. Medeiros MGGA, Carvalho LR, Franco RM. Percepção sobre a higiene dos manipuladores de alimentos e perfil microbiológico em restaurante universitário. Ciênc Saúde Colet. 2017;22(2):383-392.
  12. Giuliani CSG, Alves AF, Cirolini A, Daniel AP, Rosa VP. Avaliação e treinamento sobre as Boas Práticas de Fabricação em restaurantes self-service no município de santa maria – RS. In: Anais do Congresso Brasileiro de Ciência e Tecnologia de Alimentos; São Paulo. Brasil. Campinas : Galoá; 2018;10(1):1-5.
  13. Belphman C, Szczerepa SB. Adequação do manual de boas práticas e dos procedimentos operacionais padronizados em serviços de alimentação de Ponta Grossa, Paraná. Vig San em Deb. 2019;7(2):69-74.
  14. Lachno AS, Oliveira MS, Klaic PMA, Hermanns G. Boas Práticas de Manipulação em serviços de alimentação no município de Santa Rosa-RS. Rev de Cien e Inov. 2021;7(1):1-19.
  15. Araújo ACM, Soares MM, Gomes LL, Adami AAV. Adequação das Boas Práticas de Manipulação de alimentos durante a pandemia da covid-19 em restaurantes comerciais. Enc Biosf. 2021;18(37):17-31.
  16. Soares RT, Nishida W. Boas práticas de fabricação em Unidades de Alimentação e Nutrição comerciais com modalidade de distribuição autosserviço. J Health Sci Inst. 2020;38(1):58-63

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