Back

EXPECTATIVA DE VIDA E SAÚDE DE IDOSOS NÃO INSTITUCIONALIZADOS NO PERÍODO DE ISOLAMENTO SOCIAL CAUSADO PELA PANDEMIA DO COVID-19

Capítulo de livro publicado no livro do I Congresso Internacional em Ciências da Nutrição. Para acessa-lo  clique aqui.

DOI: https://doi.org/10.53934/9786585062015-23

Este trabalho foi escrito por:

Flavia Maria Vasques Farinazzi-Machado *; Juliana Audi Giannoni ; Lavínia Ribeiro Coelho ; Maria Fernanda Barbosa Gonçalves

* Flavia Maria Vasques Farinazzi-Machado: [email protected]

RESUMO

O mundo todo adotou medidas de distanciamento devido à pandemia causada pelo surto do Coronavírus, afetando diversas gerações, em particular, os idosos, considerados como um grupo de maior vulnerabilidade. Este estudo teve por objetivos avaliar o consumo alimentar e a qualidade de vida de idosos não institucionalizados durante o período de isolamento social causado por esta pandemia. Trata-se de um estudo observacional do tipo transversal que utilizou como instrumento de coleta de dados um questionário virtual, totalizando 59 questões fechadas e abertas, aplicado por alunos de cursos superiores com seus pais ou avós não institucionalizados, utilizando-se a idade (≥ 60 anos) como critério de inclusão. Responderam ao questionário 127 idosos com faixa etária entre 60 e 94 anos. Constatou-se como resultados que os idosos apresentaram algum tipo de comorbidade, entre as quais diabetes, hipertensão arterial e constipação intestinal. Quanto aos hábitos alimentares, boa parte relatou inclusão diária de opções saudáveis como frutas, hortaliças, carnes e derivados lácteos, mas 41% ingerem menos que um litro de água por dia, 51% não consomem alimentos integrais, e 40% não praticam exercícios físicos, hábitos que não foram influenciados pelo isolamento social. Considerando os sentimentos dos idosos durante o período, relatou-se medo e preocupações com o futuro, porém sendo fatores que pouco os preocupam ou causam alguma interferência em seu modo de vida e saúde. Os resultados antropométricos revelaram dados preocupantes quanto à ocorrência de sobrepeso e obesidade no grupo avaliado, que podem estar associadas a outros distúrbios crônicos comprometendo sua qualidade de vida.

Palavras-chave: alimentação; Coronavírus; preocupações; qualidade de vida; terceira idade

ABSTRACT

The whole world has adopted distancing measures due to the pandemic caused by the Coronavirus outbreak, affecting several generations, in particular, the older adults, considered as a group of greater vulnerability. This study aimed to evaluate the food consumption and quality of life of non-institutionalized older adults during the period of social isolation caused by this pandemic. This is a cross-sectional observational study that used a virtual questionnaire as a data collection instrument, totaling 59 closed and open questions, applied by students of higher education courses with their non-institutionalized parents or grandparents, using age (≥ 60 years) as an inclusion criterion. The questionnaire was answered by 127 older adults aged between 60 and 94 years. It was found as results that the elderly had some type of comorbidity, including diabetes, high blood pressure and constipation. As for eating habits, a large part reported daily inclusion of healthy options such as fruits, vegetables, meat and dairy products, but 41% ingest less than a liter of water a day, 51% do not consume whole foods, and 40% do not exercise, habits that were not influenced by social isolation. Considering the feelings of the elderly during the period, fear and concerns about the future were reported, but these are factors that little concern them or cause any interference in their way of life and health. Anthropometric results revealed worrying data regarding the occurrence of overweight and obesity in the evaluated group, which may be associated with other chronic disorders compromising their quality of life.

Keywords: food; Coronavirus; worries; quality of life; third age

INTRODUÇÃO

A doença COVID-19 (Coronavirus Disease 2019) caracterizada inicialmente por uma infecção respiratória provocada pelo Coronavírus da Síndrome Respiratória Aguda Grave 2 (SARS-CoV-2), foi identificada primeiramente em dezembro de 2019, em pessoas que, em comum, frequentavam um mercado atacadista de frutos do mar em Wuhan, na província de Hubei, China, sendo considerada neste período, uma epidemia (1).

Logo no início de julho de 2020, dados mundiais reconheceram a contaminação por COVID-19 em 10.665.758 pessoas em todo o mundo, segundo os dados disponibilizados pelo European Centre for Disease Prevention and Control (2). No Brasil, até março de 2022 já são confirmados mais de 600 mil óbitos por COVID-19, sendo a região sudeste o epicentro da pandemia (3).

Dados divulgados inicialmente pela China, e posteriormente corroborados por diversos países europeus indicaram que os idosos (acima de 60 anos), particularmente aqueles com sérias condições de saúde subjacentes, correm maior risco de comprometimento e maior mortalidade pelo vírus do que indivíduos mais jovens, correspondendo a aproximadamente 80% das mortes (4).

No Brasil, desde o início dos anos 70, estudos apontam um aumento da expectativa de vida no país, em consequência do crescente número de idosos da população brasileira, estimando-se o dobro do percentual de idosos para os próximos anos (5, 6).

O envelhecimento está relacionado a várias modificações fisiológicas, como alterações sensoriais no olfato e no paladar, prejuízos na capacidade de mastigação, esvaziamento gástrico e alterações neuroendócrinas que estão associadas à redução do apetite e do prazer de comer, ou mesmo metabólicas, que podem favorecer o ganho de peso ou contribuir para carências nutricionais específicas, tornando o organismo do idoso ainda mais frágil (7, 8). Soma-se a isso, tendo em vista o cenário atual, o maior risco de óbitos por COVID-19, em associação às comorbidades e doenças crônicas associadas (9, 10).

Em meio à pandemia, o Brasil e o mundo adotaram medidas de isolamento e distanciamento social, gerando, além do sofrimento com o noticiário de mortes e hospitalizações, danos emocionais e financeiros (11, 12), que afetaram diferentemente cada grupo geracional. Portanto, para além das questões fisiopatológicas e epidemiológicas, há de se discutir o impacto da pandemia COVID-19 na saúde integral do idoso.

Desta forma, o objetivo deste estudo, tendo em vista o desconhecimento da situação alimentar do idoso no Brasil associado a realidade atual da pandemia provocada pelo COVID-19, foi avaliar o consumo alimentar e a qualidade de vida, a fim de estimar possíveis carências nutricionais na alimentação dos idosos entrevistados, além de investigar os sentimentos e percepções dos idosos frente ao impacto do isolamento social e às preocupações deste período.

MATERIAL E MÉTODOS

Este trabalho consistiu num estudo observacional do tipo transversal. O instrumento de coleta de dados foi um questionário virtual contendo 59 questões divididas em fechadas e abertas, na tentativa de obter resultados mais ricos. As questões fechadas permitem respostas e análises mais simples e rápidas. No entanto, respostas abertas permitem liberdade de expressão através da linguagem própria e espontânea do entrevistado, demonstrando aspectos diferentes dos inicialmente previstos.

O questionário incidia sob os seguintes aspectos: identificação pessoal (idade, gênero), escolaridade, comorbidades, tabagismo, hábito intestinal, hábitos alimentares e identificação de alimentos consumidos e distribuídos diariamente nas refeições, e uma sessão de perguntas relacionadas a valores, esperanças, prazeres e preocupações sentidas, durante o período de isolamento social, além de medidas autodeclaradas de peso, estatura e circunferência da cintura.

A coleta de dados utilizando um instrumento virtual foi escolhida, tendo em vista a necessidade de isolamento social provocado pela pandemia relacionada ao COVID-19. O questionário foi aplicado por alunos de cursos superiores de algumas unidades das Fatecs com seus pais ou avós não institucionalizados, utilizando-se a idade (≥ 60 anos) como critério de inclusão na pesquisa. No próprio questionário virtual foi inserido um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), composto por uma página de esclarecimento sobre a pesquisa, além da solicitação de autorização para o uso dos dados. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos (nº parecer 4.666.408).

Os questionários foram tabulados e agrupados de acordo com as respostas obtidas. Os dados antropométricos foram submetidos ao programa estatístico Sisvar, por meio de Análise de Variância (ANOVA) e complementadas pelo Teste de Tukey, ao nível de 5% de probabilidade (p<0,05).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Responderam ao questionário online 127 idosos de nacionalidade brasileira, com faixa etária entre 60 e 94 anos, sendo 65% do gênero feminino. De acordo com os resultados, 66% se declararam como brancos, 19% pardos, 13% pretos e 2% amarelos ou indígenas. Considerando a religião, os dados levantados apresentaram 53% católicos, 31% evangélicos, 6% espíritas e os demais possuem outra religião, não possuem ou não informaram. Entre os entrevistados 68% possuem de 1 a 5 filhos, 20% não possuem e 12% possuem acima de 6 filhos. Levando em conta a escolaridade 24% possuem ensino fundamental incompleto, 21% ensino médio completo, 16% superior completo, 15% fundamental completo, 11% superior incompleto, 9% analfabetos e 5% possuem ensino médio incompleto. Quando perguntados sobre a existência de planos de saúde, 58% revelaram não possuir, enquanto 42% fazem parte de algum convênio.

O inquérito demonstrou que 80% dos idosos não relataram queixas quanto à mastigação e 89% quanto à deglutição dos alimentos. Quanto à qualidade da dentição, foi relatado pelos idosos que 62% deles apresentam dentição incompleta e 30% fazem uso de próteses dentárias.

Considerando que as comorbidades referem-se à “coexistência de doenças”, na figura 1 podemos observar que houve relatos de distúrbios associados pelos idosos entrevistados neste estudo, sendo que 22% identificaram ser portadores de hipertensão arterial. Outros distúrbios associados ao consumo alimentar também foram citados pelos idosos, como diabetes, dislipidemia, doenças cardíacas, e sobre peso e obesidade, entre outros.

De acordo com Silva et al. (13) o principal impacto negativo do envelhecimento populacional é, de fato, o aumento da prevalência de doenças crônico-degenerativas, causando mortalidade e incapacidade no mundo todo. No Brasil, essas doenças correspondem a 72% das causas de morte e mais de 45% da população adulta relata possuir pelo menos uma doença crônica degenerativa (14, 15, 16).

Analisando as respostas, foram observados que 89% dos idosos não possuem qualquer deficiência. Com relação ao número de medicamentos ingeridos, os resultados apontaram que 32% dos idosos fazem uso de 1 a 3 comprimidos por dia; 29% nenhum; 24% de 4 a 6; 8% de 10 ou mais e 7% de 7 a 9 comprimidos por dia.

Considerando os sintomas gastrintestinais mais comuns, 70% não apresenta nenhum sintoma, 11% relataram constipação, 9% diarreia, 7% falta de apetite e menos de 3% apresentam náuseas e vômitos. Dentre os resultados coletados 80% relatam ter urina clara e 58% apresentam hábito intestinal com frequência de evacuação diária, 24% possuem frequência de 0 a 3 vezes por semana e 18% de 4 a 6 vezes por semana.

Segundo a Organização Mundial de Gastroenterologia, a constipação afeta com maior frequência a população idosa, sendo responsável por 2,5 milhões de visitas médicas nos Estados Unidos por ano. A ocorrência desse problema tem certa prevalência em relação a comorbidades mais comuns dessa faixa etária, tal como hipertensão, obesidade e diabetes. Agravadores da constipação, além dos hábitos alimentares, são os fatores relacionados a falta de atividade física, baixo consumo de água e quantidade de fármacos ingeridos (13).

Os alimentos denominados como preferidos que apareceram mais vezes entre as respostas foram arroz (37%), carnes (34%), feijão (25%), frutas (22%), vegetais e hortaliças (19%), massas ou doces (16%), pães (10%), verduras (9%), leite (8%) e ovos (5%). Por outro lado, quando questionados sobre quais alimentos eram menos agradáveis ou causadores de algum desconforto, 33% dos idosos apontaram vegetais e hortaliças específicos, tais como, pimentão, jiló, quiabo e pepino. Ainda 18% relataram não preferir carnes, fígado e peixes, e 6% frituras.

Informações sobre a quantidade de refeições diárias identificaram que a grande maioria, 85% dos idosos fazem de 3 a 4 refeições por dia. Quanto ao preparo, 58% preparam a própria refeição, e destes, 89% seguem suas próprias memórias para cozinhar, 10% acompanham seu caderno de receitas e 1% segue programas de televisão.

O inquérito identificou que 94% dos entrevistados não possuem nenhuma alergia alimentar, 4% possuem alergia a peixes e frutos do mar e 2% a leite, embutidos ou abacaxi. A questão referente ao momento do dia em que sentem mais fome revelou que 62% dos idosos sentem mais fome na parte da manhã, 27% à tarde e 11% sentem fome no período da noite.

Em relação ao exercício físico, 60% relataram praticar alguma atividade, em especial caminhadas e 40% não fazem nenhuma atividade. A inclusão do exercício físico na rotina, principalmente dos idosos, tende a proporcionar bem estar físico e melhor qualidade de vida. Tal hábito, contribui para o fim do sedentarismo e pode também, combater doenças como depressão, auxiliar na prevenção de hipertensão, diabetes e osteoporose. Exercícios que envolvem alongamentos, movimentação corporal, relaxamento e treinamentos interferem diretamente na autoestima, ânimo, força muscular e óssea, disposição, capacidade cardiorrespiratória proporcionando melhores noites de sono e, na funcionalidade intestinal (19).

Entre os dados coletados, foram observados que 80% utilizam suplementos, vitaminas e minerais. 48% consideram ter uma vida saudável, 40% mais ou menos e 12% não se consideram saudáveis. Quanto o consumo de produtos integrais, os dados analisados apresentaram que 51% não consomem e 49% consomem, variando entre pães, aveia, granola, sementes e cereais. Contudo, a ingestão adequada de fibras acarreta efeitos benéficos ao organismo, atuando na redução ou prevenção de certas comorbidades, tais como, doenças cardiovasculares, hipertensão arterial, acidente vascular cerebral (AVC), diabetes, obesidade e problemas gastrointestinais relacionados à constipação, hemorroidas, hérnia hiatal, diverticulite e câncer de cólon (20, 21).

Referente a ingestão de balas, chicletes, chocolates, bolos, biscoitos e doces, 48% responderam que consomem de forma moderada, 42% pouco e 10% muito. Quanto ao uso de adoçantes, 78% não utilizam e entre os 22% que usufruem, diferentes marcas foram citadas no estudo.

A frequência da ingestão de refrigerantes apontou que 44% consomem de 1 a 2 vezes por semana, 21% consomem acima de 3 vezes por semana, 20% não consomem refrigerante e 15% consomem muito pouco ou raramente. Já em relação ao café, 86% ingerem café diariamente.

Quanto ao consumo de água, 41% tomam no máximo 1L por dia e 59% tomam mais de 1L diariamente. Com esses resultados, é possível notar a baixa ingestão hídrica dessa faixa etária, podendo ocasionar desidratação e outros malefícios a saúde. Beber água e outros fluidos é fundamental para a saúde e bem-estar dos indivíduos, pois a água é ingerida em função do reflexo da sede, ou por vontade do própria, independentemente da idade ou situação. No entanto, mudanças relacionadas à idade e à percepção de sede fazem com que as pessoas mais velhas sejam mais vulneráveis a desidratação (22).

Considerando o hábito de fumar, observamos que 69% dos idosos entrevistados relataram nunca ter fumado. O tabagismo é a principal causa de morte evitável em todo o mundo. Além da mortalidade, o hábito de fumar está associado com o desenvolvimento de diversas doenças e condições crônicas, principalmente neoplasias, câncer, doenças respiratórias e cardiovasculares, sobretudo no idoso, que já sofre com as alterações fisiológicas decorrentes da idade, tendo por consequências pneumonia, enfisema pulmonar e bronquite crônica(23).

 Por outro lado, considerando a ingestão de álcool, 44% dos idosos relataram fazer uso de bebidas alcoólicas e 56% deles não o fazem.

Levando em conta o consumo de leite e derivados, 93% dos entrevistados fazem uso destes produtos, sendo o leite (40%) e o queijo (40%) os mais consumidos.

Importante ressaltar que o consumo habitual de laticínios é recomendado, principalmente, para atingir a adequação diária de cálcio, um nutriente fundamental para a formação e a manutenção da estrutura óssea, entre outras funções no organismo (24). Com o avanço da idade, o déficit de cálcio pode ocasionar em fragilidade óssea e possível osteoporose, e interferir na hipertensão e problemas cardíacos. Por isso um consumo adequado de cálcio e vitamina D, a partir dos alimentos e/ou suplementos, é necessário para diminuir a taxa de perda óssea da população idosa (24, 25). Quanto ao consumo de hortaliças e frutas, 97% e 94% dos idosos relatam consumo habitual, respectivamente, destes alimentos.

Quando perguntados sobre a ingestão de carnes, 98% dos idosos têm consumo habitual, sendo a carne bovina o tipo mais citado entre eles (46%), seguido de aves (31%), suínos (17%) e peixes (6%). As informações obtidas quanto ao modo de preparo, mostraram que 45% consome a carne cozida, 28% consome a carne frita e 27% consomem a carne assada.

Na investigação sobre as preferências em cada refeição, foi possível analisar que os alimentos mais consumidos no café da manhã são: café (60%), pão (56%), leite (40%), manteiga ou margarina (21%), biscoitos e bolachas (13%), queijo (7%), bolo (6%) e aveia (5%).

No lanche da manhã, período caracterizado entre o desjejum (café da manhã) e o almoço, foi observado que 19% não o praticam e os que fazem, normalmente consomem frutas (21%), café (16%), pão (14%), leite (11%) e biscoitos ou bolachas (8%). Já no lanche da tarde, os alimentos normalmente consumidos são: pão (35%), café (32%), biscoitos ou bolachas (19%) e 20% não fazem lanche da tarde.

No almoço, os alimentos que apareceram com maior frequência foram: arroz (71%), feijão (58%), carnes (54%), saladas (43%) e legumes ou vegetais (35%). Já no jantar, foi possível observar que os alimentos mais consumidos são: arroz (50%), feijão (41%), carne (37%), saladas (28%), legumes (12%) e sopas ou caldos (8%). E quanto a ceia, entre os dados analisados, a preferência é para biscoitos ou bolachas (12%) e leite (9%) e 49% não consomem nenhum alimento, tendo como última refeição o jantar.

No Quadro 1 estão descritos os resultados referentes as questões relacionadas com os sentimentos dos idosos que participaram do estudo. Observa-se que a maioria dos idosos revelou que as perdas dos sentidos não causam interferência, ou muito pouco, em suas vidas diárias (51%) e em sua capacidade de participar das atividades rotineiras (60%). Grande parte dos idosos sente que possuem liberdade suficiente para tomar suas próprias decisões (72%), porém quando questionados se as pessoas ao seu redor respeitam sua liberdade, as respostas positivas são reduzidas para 52%. Foi possível notar também que a maior parte sente que pode controlar bastante ou extremamente o próprio futuro (54%).

Quando questionados sobre a morte, 51% não se sentem amedrontados quanto a esse assunto, 62% relatam não estar preocupados com a maneira pela qual irão morrer ou muito pouco. Em relação ao medo de não poder controlar a própria morte, boa parte dos entrevistados demonstrou muito pouco essa preocupação (57%), porém sobre a possibilidade de existência de dor antes de morrer, a maioria respondeu que teme bastante ou extremamente (53%).

Considerando o contexto atual, entre os idosos que responderam ao questionário, 53% revelaram que o isolamento social causado pelo COVID-19 influenciou em seus hábitos alimentares e consumo alimentar. Diferentes autores têm demonstrado que com o cenário atual, é notório o impacto da pandemia na qualidade de vida dos idosos e os possíveis danos que serão causados ao fim desse surto gerado pelo Coronavírus (26, 27).

As mudanças na rotina foram necessárias para priorizar a saúde nesse período devido à vulnerabilidade dessa população, as medidas do isolamento social, interferiram diretamente no contato físico, onde os abraços aconchegantes nos velhinhos foram trocados por uma tela fria de celular ao realizar ao menos chamadas de vídeo e as caminhadas, passeios e atividades ao ar livre, passaram a ser limitadas dentro de casa, tornando suas rotinas tediosas e exaustivas (27).

Algumas emoções negativas como frustrações, estresses, ansiedade, medos e incertezas quanto ao futuro e a morte, são sentimentos já sofridos em outras catástrofes e cenários de guerra, que podem ocasionar em degaste mental, depressão, transtornos pós-traumáticos, cansaço físico e emocional, devido a mudanças na rotina e grande quantidade de informações negativas expostas a essa população (28).

Considerando os dados do perfil nutricional, 24,4% dos idosos entrevistados não informaram dados antropométricos solicitados no inquérito. Na tabela 1 estão descritas as médias das variáveis separadas por gênero, e ainda que os dados não tenham sido aferidos por pesquisadores, mas sim autodeclarados pelos idosos, observou-se que os homens apresentaram, em média, valores de peso significativamente superiores às mulheres entrevistadas.

Na Tabela 2 pode ser observado que 60% dos homens e 67,22% das mulheres deste estudo apresentaram-se acima do peso, segundo a classificação de IMC, recomendada pela Organização Mundial de Saúde (29), considerando os dados autodeclarados de peso e estatura dos respondentes do estudo.

Tendo em vista que a obesidade é um dos fatores de risco do SARS-CoV-2, esse fato se torna ainda mais preocupante quando associado a outras comorbidades crônicas e alterações imunológicas, consequências da idade avançada (30). A diminuição do peso e da massa magra acontece naturalmente, dessa forma ocasionando aumento do tecido adiposo, principalmente aqueles que possuem doenças cardiovasculares e respiratórias. Tal acúmulo de gordura acaba por reduzir a ação protetora do sistema cardíaco que interfere diretamente nos pulmões e capacidade respiratória e vital e possível sobrecarga cardiovascular (31).

Na tabela 3 os resultados indicaram que 25,72% dos homens e 65,56% das mulheres apresentam risco, no mínimo, aumentado para complicações metabólicas de acordo com os valores da circunferência da cintura, cujas medidas também foram autodeclaradas pelos participantes do inquérito.

A adiposidade abdominal necessita de maior atenção, pois está relacionada a doenças crônicas, principalmente aquelas do sistema cardiovascular e outras morbidades, como diabetes mellitus tipo II. Com o avanço da idade, a gordura total do corpo pode até permanecer a mesma, mas ocorre uma redistribuição da gordura para a região abdominal ou visceral, pois, ela se centraliza e consequentemente aumenta a circunferência do abdômen (33). O excesso de adiposidade abdominal e as alterações nos níveis dos hormônios cortisol e insulina afetam diretamente o metabolismo de carboidratos, proteínas e lipídios, e aumentam a secreção de substâncias com ação pró-inflamatória no organismo. Há, ainda, desordens como um aumento da resistência insulínica, alterações na pressão arterial e nos níveis de lipídios séricos (dislipidemia), excesso de ácidos graxos livres circulantes e maior estresse oxidativo, além de hiperglicemia crônica (34, 35, 36). Todas essas alterações metabólicas, oriundas da adiposidade abdominal, implicam no desenvolvimento das doenças crônicas que podem comprometer a expectativa e qualidade de vida dos idosos.

CONCLUSÕES

Tendo em vista os aspectos analisados, conclui-se que os idosos incluem produtos saudáveis em sua alimentação diária, mas há necessidade de algumas adequações como o aumento de consumo de fibras e ingestão hídrica, além de práticas de atividade física. Possuem boa expectativa quanto aos valores, prazeres, esperanças e preocupações com o futuro, não se sentem amedrontados com a morte, mas temem a forma pela qual irão morrer e possivelmente sentirem dor.

Entre os relatos foi possível observar que para a maioria dos idosos o distanciamento social causado pelo COVID-19 influenciou seus hábitos e seu consumo alimentar, e os resultados antropométricos parecem corroborar com estes relatos, tendo em vista a ocorrência de sobrepeso e obesidade no grupo avaliado, bem como valores aumentados de circunferência da cintura.

De qualquer forma, o momento pandêmico reforçou a necessidade de maior atenção à saúde dos idosos, tanto pelo aumento da expectativa de vida no país e crescente número de idosos na população brasileira, quanto pela necessidade de se ressignificar as ações de proteção e cuidado físico e emocional, considerando sua vulnerabilidade, e respeitando sua independência e dignidade.

REFERÊNCIAS

  1. Rodríguez ES, Reyes DP. Covid-19: The outbreak caused by anew coronavírus. Bol Med Hosp Infant Mex. 2020; 77:47–53.
  2. World Health Organization. Coronavirus disease 2019 (COVID-19) situation report–51. Geneva, Switzerland: World Health Organization; 2020. Disponível em: https://www.who.int/docs/default-source/coronaviruse/situationreports/20200311-sitrep-51-covid-19.pdf?sfvrsn=1ba62e57_10. Acesso em: 02 jun 2020.
  3. BRASIL, 2022. Ministério da Saúde. Painel Coronavírus no Brasil. Disponível em: https://covid.saude.gov.br/ Acesso em: 25 mar 2022.
  4. Remuzzi A, Remuzzi G. COVID-19 and Italy: what next? Health Police. The Lancet 2020; 395:1225-1228.
  5. Heitor SFD, Rodrigues LE, Tavares DMS. Fatores associados às complicações metabólicas e alimentação em idosos da zona rural. Cien Sau Col. 2016; 21: 18-25.
  6. Carvalho JAM, Garcia RA. O envelhecimento da população brasileira: um enfoque demográfico. Cad Sau Pub. 2003; 19:725-733.
  7. Pereira SRM. Fisiologia do envelhecimento. In: Freitas EV, Py L. Tratado de geriatria e gerontologia. 4ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2016. p. 267-87.
  8. Macena WG, Hermano LO, Costa TC. Alterações fisiológicas decorrentes do envelhecimento. Mosaicum [Internet]. 10º de maio de 2018 [citado 7º de maio de 2022];15(27):223-38.
  9. Quintino ASS, Souza SC, Teixeira PG, Estácio Neto F. O impacto do envelhecimento em tempos de pandemia e o isolamento social na terceira idade. LNK [Internet]. 2021: 7(3).
  10. Zhang W. Manual de Prevenção e Controle da Covid-19 segundo o Doutor Wenhong Zhang. 1ª ed. São Paulo – SP: Polo Books, 2020. Disponível em: http://www.abennacional.org.br/site/wp-content/uploads/2020/04/Manual-de-Preven%C3%A7%C3%A3o-e-Controle-da-Covid-19-segundo-o-Doutor-Wenhong-Zhang.pdf. Acesso em: 01 out 2021.
  11. Lloyd-Sherlock P, Ebrahim S, Geffen L, Mckee M. Bearing the brunt of covid-19: older people in low and middle income countries. BMJ. 2020; 368:01052.
  12. Rezendei LFM, Thome B, Schveitzer MC, Souza-Júnior PRB, Szwarcwald CL. Adults at high-risk of severe coronavirus disease-2019 (Covid-19) in Brazil. Ver Sau Publ. 2020; 54:50.
  13. Silva AR, Sgnaolin V, Nogueira EL, Engroff P, Gomes I. Doenças crônicas não transmissíveis e fatores sócio demográficos associados a sintomas de depressão em idosos. J. bras. Psiquiatr. 2017; 66(1):45-51.
  14. Schmidt MI, Duncan BB, Azevedo ESG, Menezes AM, Monteiro CA et al. Chronic noncommunicable diseases in Brazil: burden and current challenges. Lancet 2011; 377(9781): 1949-61.
  15. BRASIL (2014). Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional de Saúde. Percepção do estado de saúde, estilos de vida e doenças crônicas: 2013. Rio de Janeiro: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística; 2014 Disponível em: ftp://ftp.ibge.gov.br/PNS/2013/pns2013.pdf. Acesso em: 28 out 2021.
  16. Malta DC, Moura L.; Prado RR, Escalante JC, Schmidt MI et al. Mortalidade por doenças crônicas não transmissíveis no Brasil e suas regiões, 2000 a 2011. Epidemiol Ser Saúde 2014; 23(4): 599-608.
  17. Klaus JH, Nardin V, Paludo J, Scherer F, Dal Bosco SM. Prevalência e fatores associados à constipação intestinal em idosos residentes em instituições de longa permanência. Rev Bra Geriatr Gerontol. 2015; 18(4).
  18. Gavanski DS, Baratto I, Gatti RR. Avaliação do hábito intestinal e ingestão de fibras alimentares em uma população de idosos. Rev Bras Obe Nutr Emag. 2020; 9(49).
  19. Santos GA, Vilela AT. Importância do exercício físico gerando qualidade de vida nos idosos. Benefícios físicos da hidroginástica na terceira idade.Revista Prisma. 2020; 1(2):34-45.
  20. Silva FM. et al. High dietary glycemic index and low fiber content are associated with metabolic syndrome in patients with type 2 diabetes. J Am Coll Nutr. 2011; 30: 141-149.
  21. Scott KP, Duncan SH, Flint HJ. Dietary fibre and the gut microbiota. Nutrition Bulletin. 2008;33(1):201-11.
  22. Dias TDP. Hidratação em Idosos Projeto ‘Água Viva’. Coimbra, 2014. Disponível em: http://hdl.handle.net/10400.26/21444. Acesso em 06 nov 2021.
  23. Buteri Filho CB, Martins MVM, Gomes LZ, Nalon KP et al. Tabagismo no Brasil: impacto econômico na saúde pública e seu tratamento. Rev Eletr Acervo Médico. 2021; 1(1), e9043.
  24. Martínez MAR, Cohen ECG. Role of Ca2+ and vitamin D in the prevention and treatment of osteoporosis. Pharm Therapeutics. 2002; 93:37-49.
  25. Dias FL, Rodrigues MSR. Deficiência de cálcio em pessoas idosas: Causas, consequências e intervenções nutricionais.Rev Cient Multidisc Núcleo Con. 2020; 4(11): 41-60.
  26. Brooks SK, Webster RK, Smith LE, Woodland L, et al. The psychological impact of quarantine and how to reduce it: rapid review of the evidence. The Lancet. 2020; 395(10227):912-20.
  27. Silva MVS, Rodrigues JA, Ribas MS, Sousa JCS, Castro TRO et al. O impacto do isolamento social na qualidade de vida dos idosos durante a pandemia por COVID-19. Enfermagem Brasil 2020; 19 (4Supl):S34-S41.
  28. Fiorillo A, Gorwood P. The consequences of the COVID-19 pandemic on mental health and implications for clinical practice. 2020. Eur Psych 2020; 63(1).
  29. Organização Mundial da Saúde (World Health Organization). Physical status: the use and interpretation of anthropometry. Geneva: World Health Organization; 1995. (Technical Report Series, 854). Acesso em: 10 nov de 2020.  
  30. Piva S, Filippini M, Turla F, Cattaneo S, Margola A et al. Clinical presentation and initial management critically ill patients with severe acute respiratory syndrome coronavirus 2 (SARS-CoV 2) infection in Brescia, Italy. Rev J Crit Care. 2020; 58(1):29-33.
  31. Sattar N, Mcinnes IB, Mcmurray JJV. Obesity a Risk Factor for Severe COVID-19 Infection: Multiple Potential Mechanisms. Circulation. 2020; 142(1): 4-6.
  32. SBC. Sociedade Brasileira de Cardiologia. I diretriz brasileira de prevenção cardiovascular. Arquivos Brasileiros de Cardiologia. Rio de Janeiro. 2013; 101(6): 1-63.
  33. Souza R, Fraga JS, Gottschall CBA, Bunello FM, Rabito EI. Avaliação antropométrica em idosos: estimativas de peso e altura e concordância entre classificações de IMC. Rev Bras Ger Geront. 2013; 16(1):81-90.
  34. Silveira EA, Vieira LL, Souza JD. Elevada prevalência de obesidade abdominal em idosos e associação com diabetes, hipertensão e doenças respiratórias. Cien Saúde col. 2018; 23(3): 903.
  35. Pereira LO, Francischi RP, Júnior AHL. Obesidade: hábitos nutricionais, sedentarismo e resistência à insulina. Arq Bras Endocrinol Metabol. 2003; 47 (2), 111-127.
  36. Wanderley EM, Ferreira VA. Obesidade: uma perspectiva plural. Ciência Saúde Coletiva. 2010; 15(1): 185-194.

Fundada em 2020, a Agron tem como missão ajudar profissionais a terem experiências imersivas em ciência e tecnologia dos alimentos por meio de cursos e eventos, além das barreiras geográficas e sociais.

Leave A Reply

//
//
Jaelyson Max
Atendimento Agron

Me envie sua dúvida ou problema, estou aqui para te ajudar!

Atendimento 100% humanizado!