PROPRIEDADES FÍSICO-QUÍMICAS E ANTIOXIDANTES DE ÓLEO DE PUPUNHA (Bactris gasipaes)
Capítulo de livro publicado no livro do “ÓLEOS VEGETAIS: PROPRIEDADES FÍSICO-QUÍMICAS, BIOATIVAS E ANTIOXIDANTES“. Para acessa-lo clique aqui.
Este capítulo de livro foi escrito por:
Tainara Costa1; Carolina Médici Veronezi2; Neuza Jorge3*
1Doutora em Engenharia e Ciência de Alimentos, Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – UNESP.
2Pós-doutoranda do Depto de Engenharia e Tecnologia de Alimentos, Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – UNESP.
3Docente do Depto de Engenharia e Tecnologia de Alimentos, Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – UNESP; *E-mail: [email protected].
Resumo: Os frutos amazônicos têm elevados potenciais econômico, nutricional e funcional contribuindo para a ingestão diária de nutrientes e compostos bioativos. Assim, o trabalho teve como objetivos avaliar a composição nutricional da polpa e amêndoa de pupunha (Bactris gasipaes), bem como as propriedades físico-químicas e capacidade antioxidante de suas frações lipídicas. O teor de lipídios das duas frações foi superior a 15%, porém os principais macronutrientes encontrados foram as fibras alimentares e os carboidratos disponíveis. Houve significativa presença de minerais, especialmente, sódio, magnésio, fósforo, potássio, ferro e cálcio. As propriedades físico-químicas comprovaram a boa qualidade das frações lipídicas. O índice de estabilidade oxidativa pode ter sido influenciado pela composição de ácidos graxos, atingindo valor de 112,9 h para a fração lipídica da polpa de pupunha. Os compostos bioativos mais abundantes foram o α-tocoferol, carotenoides e compostos fenólicos totais para a polpa, e o β-sitosterol para a amêndoa. As frações lipídicas mostraram ter significativa capacidade antioxidante. Por fim, essas frações lipídicas podem apresentar benefícios quando consumidas, combatendo radicais livres in vivo e, ainda, servirem como matéria-prima para as indústrias alimentícia, farmacêutica e cosmética.
Palavras-chave: amêndoa; compostos bioativos; polpa; qualidade
INTRODUÇÃO
O Brasil, graças a sua localização geográfica e dimensão territorial, possui uma grande diversidade de espécies de pequenos frutos distribuídos pelos seis biomas. A região amazônica é o maior ecossistema tropical remanescente do mundo e abrange cerca de 12.000 espécies de plantas medicinais e terapêuticas (TER STEEGE et al., 2019).
Entre essas plantas encontram-se as palmeiras da família Arecaceae que, no Brasil, representam cerca de 390 espécies, sendo a maior parte nativa da Amazônia. Entre os 41 gêneros pertencentes a essa família destacam-se de forma regional, nacional e internacional os Euterpe, Bactris, Astrocaryum, Oenocarpus e Jessenia (SOUZA; LIMA, 2019). Os frutos dessas palmeiras possuem quantidades importantes de amido, proteínas, vitaminas e lipídios, em diferentes proporções. Além disso, altos níveis de pigmentos lipossolúveis, que correspondem aos carotenoides, principalmente o β-caroteno, são encontrados também nesses frutos (SOUZA et al., 2020).
A pupunha, Bactris gasipaes, é um fruto tropical comum nas Américas Central e do Sul (NERI-NUMA et al., 2018). Os frutos são de formatos e tamanhos variados e organizados em cachos. Possuem uma fina casca, de coloração amarela, vermelha ou laranja, dependendo da variedade e estádio de maturação, além de uma polpa comestível com elevado conteúdo de carboidratos, lipídios e carotenoides. Os frutos são consumidos principalmente após o cozimento em água salgada, porém podem ser utilizados para a produção de farinha, semelhante ao fubá de milho (COSTA et al., 2019).
Estudos demostraram que a pupunha pode ser considerada fonte de pró vitamina A, a qual apresenta papéis fisiológicos importantes, como modulação óptica, reprodutiva, funções imunológicas e queratinização da pele (SANTOS; ALVES; ROCA, 2015; HU et al., 2020). Matos et al. (2019) encontraram carotenoides tanto na casca (33,69 mg/100 g), quanto na polpa (3,18 mg/100 g) de pupunha, e concluíram que este fruto tem um elevado potencial para ser utilizado como fonte de carotenoides em indústrias alimentícias e farmacêuticas como corantes e/ou ingredientes bioativos.
A pupunha tem sido usada pelos ameríndios na medicina tradicional para combater hepatite, malária, vermes, parasitas e para aliviar dores no estômago e ouvido (CABALLERO-SERRANO et al., 2019). Além disso, pesquisas mostraram que o extrato da polpa de pupunha possui atividades antimicrobiana contra Pseudomonas aeruginosa e Staphylococcus aureus, antioxidante e efeito antiobesogênico (MELHORANÇA FILHO; PEREIRA, 2012; CARVALHO et al., 2013; SANTOS et al., 2015).
Considerando os potenciais econômico, nutricional e funcional dos frutos amazônicos, os objetivos deste trabalho foram avaliar a composição nutricional da polpa e amêndoa de pupunha (Bactris gasipaes), bem como as propriedades físico-químicas e capacidade antioxidante de suas frações lipídicas.
MATERIAL E MÉTODOS
Material
Preparação das amostras
Foram utilizados frutos de Bactris gasipaes maduros, provenientes de região Norte do Brasil (01º27’21″S e 48º30’16″W). Os frutos que apresentavam rachaduras, danificações por insetos, animais e/ou aves foram desprezados. Após a seleção, a polpa e a amêndoa foram retiradas manualmente e secas em estufa com circulação de ar forçada a 40ºC.
Óleos
As frações lipídicas da polpa e amêndoa, separadamente, foram obtidas por extração com éter de petróleo a 40-60ºC utilizando extrator Soxhlet. Em seguida, foram acondicionadas em frascos de vidro âmbar, inertizadas com nitrogênio gasoso e armazenadas a -18°C.
Métodos
Composição química
As determinações analíticas de umidade, lipídios e cinzas foram realizadas de acordo com os métodos oficiais da AOCS (2009). As proteínas foram determinadas pelo método de Kjeldahl, descrito pela AOAC (2012). Fibras alimentares solúveis e insolúveis, foram determinadas pela técnica gravimétrica enzimática, segundo o método de Prosky et al. (1992); os carboidratos totais foram quantificados por diferença e o valor calórico foi calculado utilizando fator de correção de 9 kcal/g para lipídios e 4 kcal/g para os teores de proteínas e carboidratos, segundo o método de Merril e Watt (1973).
Os teores de minerais foram extraídos segundo método da AOAC (2012) e quantificados por espectrofotômetro de emissão óptica por plasma indutivamente acoplado (modelo 720-ES, Varian, Walnut Creek, Estados Unidos), utilizando uma curva de calibração para cada mineral e os resultados foram expressos em mg/100 g.
Propriedades físico-químicas e antioxidantes
Para as determinações de ácidos graxos livres, índices de peróxidos, dienos conjugados, iodo, refração, saponificação, matéria insaponificável e estabilidade oxidativa foram utilizados os métodos oficiais da AOCS (2009). A estabilidade oxidativa foi realizada em Rancimat (modelo 743, Metrohm Ltda., Herisau, Switzerland) a 100°C e fluxo de ar de 20 L/h.
O perfil de ácidos foi realizado por cromatografia a gás dos ésteres metílicos, conforme o método da AOCS (2009). Foi utilizado um cromatógrafo (modelo CG 3900, Varian, Walnut Creek, Estados Unidos) com coluna capilar de sílica fundida (CP-Sil 88 de 60 m de comprimento, com diâmetro interno de 0,25 mm e espessura do filme de 0,20 µm). O gás de arraste foi o hidrogênio com velocidade linear de 30 mL/min, a temperatura da coluna de 90 a 195ºC, com aumento de 10ºC/min, mantida em isoterma por 16 min, as temperaturas do injetor e detector de 230 e 250ºC, respectivamente e razão de divisão de 1:30. A identificação dos ácidos graxos foi realizada por comparação dos tempos de retenção das amostras teste com o tempo de retenção de padrões cromatográficos de ésteres metílicos. Utilizou-se como padrão uma mistura composta de 37 ésteres metílicos de ácidos graxos (Supelco, Bellefonte, Estados Unidos), de C4:0 a C24:1, com pureza entre 99,1 e 99,9%. Por meio do perfil de ácidos graxos foram calculados os índices de aterogenicidade e trombogenicidade, conforme Ulbricht e Southgate (1991) e a razão hipocolerterolêmica/hipercolesterolêmica de acordo com Santos-Silva, Bessa e Santos-Silva (2002).
A composição provável de triacilgliceróis das frações lipídicas foi determinada pelo uso de programa computacional desenvolvido por Antoniosi Filho, Mendes e Lanças (1995) que leva em consideração o perfil de ácidos graxos. Grupos com concentração total de triacilgliceróis menor que 1% não foram considerados.
A composição de tocoferóis, utilizando o método da AOCS (2009), foi obtida em cromatógrafo líquido de alta eficiência (modelo 210-263, Varian, Walnut Creek, Estados Unidos), com detector de fluorescência, coluna de aço inox empacotada com sílica (100 Si, Microsorb, Varian, Walnut Creek, Estados Unidos) e comprimentos de ondas de excitação e emissão de 290 e 330 nm, respectivamente. Os teores de tocoferóis individuais foram expressos em mg/kg.
Para a análise dos teores de fitosteróis, a amostra passou por saponificação prévia, conforme metodologia descrita por Duchateau et al. (2002). Já, o perfil de fitosteróis foi determinado conforme AOCS (2009), em cromatógrafo a gás (modelo Plus-2010, Shimadzu, Chiyoda-ku, Toquio, Japão) equipado com detector de ionização de chama, sistema de injeção split e coluna capilar de sílica fundida (Restek RTX 5, Shimadzu, Chiyoda-ku, Toquio, Japão) e as temperaturas utilizadas no injetor e no detector foram de 280 e 320°C, respectivamente. Os fitosteróis foram identificados por comparação com o tempo de retenção dos padrões de colesterol, campesterol, estigmasterol, β-sitosterol e estigmastanol (Sigma-Aldrich, St. Louis, MO) com grau de pureza de 99, 99, 95, 98 e 97,4%, respectivamente, analisados nas mesmas condições das amostras e os resultados expressos em mg/100 g.
Carotenoides totais foram medidos por espectrofotometria de varredura, segundo metodologia descrita por Rodriguez-Amaya (2004). A quantificação foi calculada por intermédio da absorção no comprimento de onda de absorção máxima e valor de A de 2592, em éter de petróleo e os resultados expressos em μg/g. Os compostos fenólicos totais foram extraídos de acordo com o método proposto por Parry et al. (2005) e analisados por espectrofotometria utilizando reagente de Folin-Ciocalteu e curva padrão de ácido gálico, conforme método descrito por Singleton e Rossi (1965) e os resultados expressos em mg EAG/g.
A capacidade antioxidante foi realizada em espectrofotômetro (modelo UV-VIS mini 1240, Shimadzu, Chiyoda-ku, Tóquio, Japão). O sistema β-caroteno/ácido linoleico foi descrito por Marco (1968) e modificado por Miller (1971), e expresso em % de inibição de radicais livres. O método de captura do radical livre ABTS•+ foi realizado segundo Re et al. (1999) e o resultado expresso em µM Trolox/100 g. A análise de DPPH• foi realizada de acordo com o método de Kalantzakis et al. (2006), sendo os resultados expressos em porcentagem. O método FRAP empregado foi o descrito por Szydlowska-Czerniak et al. (2008), cujos resultados foram expressos em μM Trolox/100 g.
Análise estatística
Os resultados obtidos das determinações analíticas foram submetidos à análise de variância e as diferenças entre as médias foram testadas a 5% de probabilidade pelo teste de Tukey, através do programa ASSISTAT, versão 7.6.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Observa-se que os teores de umidade e proteínas apresentaram diferença significativa, com destaque para as amêndoas, 5,5 e 10,3%, respectivamente. (Tabela 1). O fruto analisado pode ser considerado boa fonte de lipídios, pois ambas as frações contribuíram com mais de 15% desse macronutriente.
O teor de cinzas é indicativo da quantidade de minerais presentes, desta forma, a amêndoa pode ser considerada fonte de minerais, uma vez que o seu conteúdo de cinzas, foi de 3,2%. Em relação às fibras alimentares, solúveis e insolúveis, têm sido identificadas como importantes componentes das células vegetais que resistem às enzimas digestivas dos seres humanos. A pupunha mostrou ser importante fonte de fibra alimentar total, com destaque para a amêndoa (47,2%). Por outro lado, a polpa demostrou maior quantidade de fibras solúveis (13,6%) e carboidratos (39,4%).
Pires et al. (2019) estudando a composição centesimal da polpa de pupunha encontraram quantidades diferentes ao deste estudo. Esses autores afirmam que a composição dos frutos pode estar relacionada com o seu tamanho. Em relação ao valor calórico, a polpa pode ser considerada excelente fonte de energia, pois seu valor é superior ao encontrado em farinhas convencionais, como trigo integral (339 kcal/100 g) e soja desengordurada (329 kcal/100 g).
Considerando a importância nutricional do selênio e zinco como antioxidantes e os seus conteúdos limitados em alimentos vegetais, a pupunha pode ser considerada como boa fonte destes minerais. No entanto, deve-se ter cautela com a ingestão de polpa, pois a quantidade de sódio é elevada, representando cerca de 15,2% da ingestão diária adequada (1,5 g/dia). Verificou-se também, quantidades consideráveis de potássio, fósforo, magnésio e cálcio, que são benéficos para o organismo. Portanto, o seu consumo é importante para o equilíbrio hidroeletrolítico de cada indivíduo.
Conforme a Tabela 2, a fração lipídica da polpa mostrou maiores quantidade de ácidos graxos livres, peróxidos e dienos conjugados em relação a amêndoa, indicando a ocorrência de degradações hidrolíticas e oxidativas, e, consequentemente, um óleo de menor qualidade. Além da influência causada pela composição natural das amostras, essa diferença também pode ter ocorrido pelo fato de a polpa estar totalmente exposta à temperatura da estufa no momento da secagem prévia, após o recebimento dos frutos. Por outro lado, a amêndoa estava envolta pelo endosperma ou caroço, que provavelmente protegeu-a da ação da temperatura e do oxigênio.
O índice de saponificação é inversamente proporcional ao peso molecular médio dos ácidos graxos dos glicerídeos presentes. Sendo assim, pode-se inferir que a fração lipídica da amêndoa é constituída por ácidos graxos de menor peso molecular que da polpa. Como a matéria insaponificável inclui substâncias naturais como esteróis, tocoferóis, pigmentos e hidrocarbonetos, as frações lipídicas analisadas devem conter elevadas quantidades desses compostos, sobretudo a polpa, que apresenta maior quantidade (2,6%), diferindo significativamente da amêndoa.
A estabilidade oxidativa é um importante parâmetro para avaliar as possíveis aplicações dos óleos em alimentos e outros produtos comerciais. Observa-se que a fração lipídica da polpa apresentou estabilidade oxidativa de 112,9 h, quase 5 vezes mais em relação a amêndoa, podendo inferir que pode ser mais estável em processos de aquecimento.
Como mostra a Tabela 3, a quantidade de ácidos graxos saturados prevaleceu na fração lipídica da amêndoa de pupunha (80,79%), enquanto para o óleo da polpa, se destacaram os ácidos graxos monoinsaturados, representado por oleico (48,65%) e os poli-insaturados, prevalecendo o linoleico (6,59%). Santos et al. (2017) encontraram em óleo extraído do mesocarpo de pupunha, os ácidos palmítico (56,5%) e oleico (43,5%) como os majoritários.
A razão entre os ácidos graxos poli-insaturados e saturados em óleo vegetal expressa a funcionalidade lipídica do material e a potencialidade do óleo, sendo que, quanto menor seu valor, melhor sua ação na prevenção de doenças crônicas degenerativas (PINTO et al., 2018).
Santos et al. (2020) investigando o perfil cromatográfico do óleo de pupunha encontraram valor aproximado ao deste estudo, 0,12, na relação entre os ácidos graxos poli-insaturados e saturados, indicando elevada funcionalidade. A fração lipídica da polpa apresentou menores índices de aterogenicidade e trombogenicidade, sugerindo que, seu consumo possui uma menor chance de causar agregação plaquetária (BARROS et al., 2013). Além disso, o óleo da polpa mostrou maior valor na razão hipocolesterolêmica/hipercolesterolêmica. Esta relação está diretamente relacionada ao benefício oferecido ao metabolismo do colesterol e à formação de lipoproteínas de alta densidade, e, quanto maior for o seu valor, mais adequado será o óleo para o consumo humano (SANTOS-SILVA; BESSA; SANTOS-SILVA, 2002).
Santos et al. (2020) estudando o perfil cromatográfico e os compostos bioativos do óleo de pupunha encontraram maiores índices de aterogenicidade (1,1) e trombogenicidade (2,04) e menor razão hipocolesterolêmica/hipercolesterolêmica (0,84) do que a fração lipídica da polpa deste estudo, porém, mesmo assim, concluíram que a pupunha é um alimento com potencial para prevenir doenças coronarianas. Ainda, de acordo com estes autores, esses resultados derivados do perfil cromatográfico podem confirmar a funcionalidade das frações lipídicas da pupunha na prevenção de doenças cardiovasculares e sua importância quando adicionada à dieta habitual.
Dos lipídios disponíveis como fonte calórica, os triacilgliceróis são os maiores exemplos e se diferenciam de acordo com o tamanho de suas cadeias carbônicas. É possível observar que a fração lipídica da polpa de pupunha contém cinco tipos de triacilgliceróis (46 a 54 NCE), predominando o 52 NCE (43,2%), enquanto a fração da amêndoa apresentou dez tipos de triacilgliceróis (32 a 50 NCE), sendo o triacilglicerol 42 NCE o majoritário (17,2%) (Tabela 4). Ressalta-se que a fração lipídica da polpa de pupunha apresentou perfil de triacilgliceróis com maior número de carbono equivalente e mais insaturado quando comparado ao da amêndoa, assim como o perfil de ácidos graxos.
Nos óleos vegetais, os tocoferóis protegem os ácidos graxos insaturados da oxidação lipídica, e no organismo humano apresentam atividade biológica de vitamina E. O único isômero encontrado nas frações lipídicas da polpa e amêndoa de pupunha foi o α-tocoferol, com destaque para a polpa (Tabela 5). O α-tocoferol é a forma mais comum de vitamina E, e é predominante também em outros óleos vegetais, como os óleos de palma (98,7%), girassol (96,13%) e azeite de oliva virgem (92%) (KAMAL-ELDIN, 2006; SCHWARTZ et al., 2008).
Ao avaliar a composição de esteróis nas frações lipídicas, verificou-se diferença significativa (p > 0,05), com maiores teores de fitosteróis totais (296,3 mg/100 g) na amêndoa. Observou-se também, que o estigmasterol não foi detectado na fração lipídica da amêndoa, enquanto o Δ-5-avenasterol e Δ-7-avenasterol não foram encontrados na polpa. O β-sitosterol foi o esterol presente em maior quantidade nas frações lipídicas da polpa e amêndoa, com teores de 164,2 e 268,9 mg/100 g, respectivamente.
Tanto os teores de carotenoides totais, quanto os de compostos fenólicos totais foram maiores na fração lipídica da polpa. Estudos mostram que a ingestão frequente desses compostos tem sido associada a uma diminuição na incidência de doenças crônico-degenerativas (LUNA-GUEVARA et al., 2018; BRITTON, 2020).
Além disso, a bioacessibilidade dos carotenoides extraídos de pupunha e incorporados como corantes alimentares é maior do que os mesmos tipos de carotenoides em frutos liofilizados, conforme pesquisa realizada por Mesquita et al. (2021).
Chisté et al. (2021) avaliando a composição de carotenoides e compostos fenólicos de polpa de pupunha de coloração amarela e laranja, após o cozimento, averiguaram que os frutos da pupunha laranja exibiram uma maior porcentagem relativa de carotenoides pró-vitamina A do que os frutos amarelos, indicando o alto potencial dessa variedade. Ambas as variedades apresentaram 11 tipos de compostos fenólicos, porém em quantidades diferentes. Matos et al. (2019) sugeriram uma classificação de acordo com a quantidade de carotenoides, considerando baixa (0–100 µg/100 g), moderada (100–500 µg/100g), alta (500–2000 µg/100g) e muito alta (≥ 2000 µg/100g). Assim, pode-se inferir que a polpa é uma fonte bastante elevada de carotenoides, embora a amêndoa também tenha quantidade alta.
De acordo com a Tabela 6, observa-se que ambas as frações lipídicas apresentaram capacidade antioxidante, porém com comportamentos distintos entre os sistemas β-caroteno/ácido linoleico, ABTS•+, DPPH• e FRAP.
A fração lipídica da amêndoa mostrou maiores inibição de radicais livres (71,9%) pelo método β-caroteno/ácido linoleico e capacidade antioxidante por meio do ABTS•+ (46,9 µM Trolox/100 g); enquanto, a polpa se destacou pelos métodos DPPH• (64,2%) e FRAP (177,3 µM Trolox/100 g). Essa diferença na capacidade antioxidante das frações lipídicas pode estar relacionada ao radical livre gerador ou oxidante utilizado nestas medidas.
Os ensaios DPPH• e ABTS•+ apresentam os mesmos mecanismos de reação, ou seja, agem por meio dos mecanismos de transferência de átomo de hidrogênio e de transferência de um elétron, porém, o DPPH• não mede a capacidade antioxidante lipofílica e hidrofílica, enquanto o ABTS•+ é responsável pelas duas medidas (CASTELO-BRANCO; TORRES, 2011). Já, o método FRAP determina a capacidade antioxidante na fração polar de óleos vegetais ricos em compostos fenólicos (JARDINI et al., 2010).
CONCLUSÕES
A polpa e a amêndoa de pupunha apresentaram teores significativos de lipídios (> 15%), porém, os principais macronutrientes encontrados foram fibra alimentar e carboidratos totais, além do valor calórico. As frações lipídicas apresentaram boa qualidade físico-química, destacando a polpa por ser mais estável, provavelmente por se tratar de um óleo alto oleico e rico em compostos bioativos. Tais fatos levam a crer que estas frações lipídicas podem apresentar benefícios quando consumidas, combatendo radicais livres in vivo. Conclui-se que é possível a utilização da polpa e amêndoa do fruto de pupunha e sua fração lipídica como matérias-primas nas indústrias alimentícia, farmacêutica e cosmética.
AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem à Coordenação de Aperfeiçoamento Pessoal de Nível Superior (CAPES), pela bolsa de doutorado e ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pela concessão do auxílio à pesquisa e bolsa de produtividade.
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