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Utilização de ferramentas de gerenciamento de riscos para uma cozinha industrial: modismo ou necessidade?

Autores: Elaine de Oliveira Pinto1, Gisela Silva da Costa2, Larissa Dias Campos3, Sérgio Thode Filho4. Todos do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro, Mestrado em Ciência e Tecnologia de Alimentos (PCTA/IFRJ).

As etapas de uma alimento pronto para serem consumidos são desenvolvidos em uma unidade de alimentação e nutrição (UAN) oferecidos por serviços específicos para este fim, neste caso, uma UAN hospitalar, que inicia este processo com a recepção da matéria-prima e segue até a entrega da dieta para o paciente (ANVISA, 2004).

Para que os pacientes internados tenham uma refeição de qualidade, todas as etapas do sistema de trabalho devem estar funcionando corretamente. Um desses etapas é o sistema de gestão de segurança e saúde no trabalho, que tem por objetivo garantir a segurança dos colaboradores, aumentando a produtividade, a qualidade das refeições e a diminuindo o número de acidentes de trabalho.

Todo esse processo é controlado por ferramentas para gerenciamento dos riscos, que consiste em processos que possam identificar, analisar, avaliar e resolver ou minimizar os riscos.

Agentes de riscos em uma cozinha industrial são encontrados frequentemente neste ambiente devido ao tipo de serviço prestado. Estes riscos são classificados como riscos toxicológicos, biológicos, químicos, mecânicos e ambientais.

Adicionalmente, os riscos ambientais podem ser classificados como físicos químicos e  biológicos, segundo a Norma Regulamentadora 09 publicada na Portaria nº 3.124/1978. Embora a NR-9 (1994) não cite os riscos ergonômicos e de acidentes, a portaria n.º 25, de 29 de dezembro de 1994 (1994), os incluiu em seus anexos, na classificação dos riscos ocupacionais, considerando riscos ergonômicos aqueles que causem desconforto ao trabalhador. Já os riscos de acidentes são os usos de equipamentos, produtos, disposição das instalações, proteções e qualquer tipo de risco que possam gerar acidentes durante o exercício das atividades laborais (BRASIL, 2020).

Deste modo, devido à grande manipulação desses alimentos e à grande oferta de nutrientes presentes neles, aumentam os riscos de contaminação desde o início do processo. Por isso, é necessário garantir as boas práticas de segurança e higiene dos produtos.

Um estudo desenvolvido em uma Unidade de Alimentação e Nutrição (UAN) de um Hospital Universitário na cidade do Rio de Janeiro – RJ, na cozinha industrial, área específica de produção das grandes refeições para pacientes com 116 trabalhadores analisou os riscos encontrados nesta UAN, onde sequencialmente realizou-se um brainstorming, reuniões com os trabalhadores, análises observacionais, relatório fotográfico e preenchimento uma ferramenta de priorização das fontes de riscos identificados para posterior tomada de decisões.

Foram identificados 4 riscos físicos, 4 químicos, 6 biológicos, 6 ergonômicos e 8 riscos de acidentes. O risco identificado considerado mais grave foi o de acidente provocado por um vazamento na tubulação de gás que alimenta o fogão. Também foram encontrados riscos biológicos (fungos, bolores, insetos e ratos), outros riscos de acidentes (coifas da exaustão com presilhas e varas soltas). Também foram identificadas presença de insetos que muitas vezes caem em alimentos na hora da preparação ou do porcionamento, as moscas ingerem fezes e alimentos em decomposição. A presença desses vetores para locais que atuam com manipulação de alimentos, representa um risco muito grave, já que elas podem transmitir mais de 100 diferentes tipos de doenças que colocam a saúde do trabalhador e a segurança do alimento em risco, gerando prejuízos financeiros, pois o descarte é obrigatório caso pousem ou caiam sobre os alimentos.

Foram identificados os riscos químicos (substâncias químicas manipuladas incorretamente) e os riscos físicos (falta de EPI, uso contínuo de luva de látex pelo cozinheiro próximo as chamas, iluminação inadequada e equipamentos sem proteção). O uso contínuo de luva de látex pelo cozinheiro (Figura 1-C) denota um equívoco no que tange a conscientização sobre a higienização correta das mãos, pois muitos trabalhadores pensam que ao utilizar as luvas seria uma medida suficiente de higiene. Porém, esta prática contribui para que a higienização correta das mãos seja negligenciada. Além disso, segundo a CVS 5/2013, o uso do látex não é permitido em processos que envolvam calor, como cozimento e fritura. A iluminação inadequada no ambiente de trabalho pode prejudicar a saúde física ou psicológica de um trabalhador, além de afetar seu rendimento. Esta não conformidade em um ambiente de cozinha industrial aumenta consideravelmente os erros e a viabilidade de um acidente de trabalho. Já a falta de EPI’s e os equipamentos sem proteção e com altos ruídos prejudicam a audição além de representar risco físico.

Os resultados do relatório fotográfico nos setores da cozinha estão apresentados na figura 1. Ao longo do período de análise, foram observados ruídos excessivos provocados por equipamentos sem manutenção (A). EPI’s impróprios para o uso (B). Utilização de luva de latex, possibilitando uma doença transmitida por alimento (C). Mesa de trabalho com altura inadequada para o trabalhador e ausência de sapato de segurança (D). Manutenção de equipamento com o uso de um balde plástico (E), Diluição inadequada dos produtos de limpeza (F). Apesar da existência da legislação brasileira, os índices de acidentes do trabalho ainda são muito altos e geralmente decorrentes das más condições e da falta de segurança dos ambientes laborais somados à falta de fiscalização por parte dos órgãos competentes. O cumprimento das Normas Regulamentadoras (NRs) um desafio para as UAN, onde os gestores precisam ter em mente que a segurança alimentar, passa obrigatoriamente pela saúde do trabalhador.

Figura 1. Relatório fotográfico da cozinha industrial da UAN. Imagens do relatório fotográfico, referente aos diferentes grupos de risco identificados. Risco Físico (A), Risco Físico (B), Risco biológico (C), Risco ergonômico e de acidente (D), Risco de acidente e (E), Risco químico (F).
Fonte: Autores (2021-2022)

Os dados apontaram que a verificação diária e as ações corretivas permitem a segurança do trabalhador e do alimento contribuindo para a eficácia das atividades laborais, diminuindo o número de acidentes de trabalho, baixo índice de absenteísmo e licenças, garantindo a qualidade das dietas oferecidas aos pacientes e a segurança ocupacional.

A avaliação dos riscos ambientais é de suma importância para o gerenciamento da saúde e segurança do trabalho em cozinhas industriais, pois diante destes dados é possível elaborar medidas mitigadoras para o controle dos riscos ou eliminação dos riscos, melhorando o ambiente de trabalho e garantindo a saúde e segurança dos trabalhadores.

Sobre os autores:

1Elaine de Oliveira Pinto: Graduada em Nutrição pela Universidade Federal Fluminense. Mestranda em Ciência e Tecnologia de Alimentos do Instituto Federal do Rio de Janeiro. Residência em Nutrição Institucional do Hospital Universitário Pedro Ernesto. Desde 2013 Servidora do Estado do Rio de Janeiro no Hospital Universitário do Rio de Janeiro/UERJ. Desde 01/05/2017 participa do quadro da chefia da Divisão de nutrição do Hospital Universitário Pedro Ernesto, inicialmente pelo Controle de qualidade e atualmente chefe da Alimentação Coletiva, sendo responsável pelo sistema de prescrição nutricional, faturamento, e supervisão da equipe de fiscalização da produção de alimentos pela empresa terceirizada servidos aos pacientes. Participação na equipe de elaboração dos editais para terceirização para prestação deso serviço de alimentação dos pacientes. Formada no curso superior de tecnologia em Sistemas de Computação pela UFF. 

2Gisela Silva da Costa: Nutricionista, mestranda do Programa de Pós-Graduação em Ciência e Tecnologia de Alimentos e especialista em nutrição clínica pela Universidade São Camil. Tem experiência em produção, terapia nutricional, lactário e nutrição clínica. É servidora desde 2015 no Instituto Nacional de Câncer, atuando no Centro de manipulação das dietas enterais e lactário e na assistência dos pacientes oncológicos.

3Larissa Dias Campos: Nutricionista, mestranda em Ciência e Tecnologia de Alimentos pelo IFRJ e especialista em Vigilância Sanitária e Qualidade de Alimentos e em Saúde Pública. É Auditora Interna em Segurança de Alimentos na Norma ISO 22000:2018 e Auditora Interna em Sistemas de Gestão Integrado nas Normas ISO9001:2015, ISO 14001:2015 e ISO45001: 2018.

4Sérgio Thode Filho: Professor Associado (D402) no Departamento de Alimentos do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro (IFRJ). Docente permanente do Programa de Pós-Graduação em Ciência e Tecnologia de Alimentos (PCTA/IFRJ). Pós-Doutorado em Recursos Naturais e Proteção Ambiental, Doutor em Ciências, Mestre em Sistemas de Gestão Integrada (Ambiente, Qualidade, Saúde e Segurança do Trabalho), Higienista Ocupacional, Administrador e Biólogo. Ensino e Pesquisa em Gestão de Segurança Ocupacional e Qualidade em UAN’s, Avaliaçao de Impacto Ambiental e Síntese de Biomateriais.

Referências:

de Oliveira Pinto, E., Aquino, CRC, da Costa, GS, Campos, LD, Rodrigues, YG, & Thode Filho, S. (2022). Levantamento de riscos ambientais em uma cozinha industrial. Alimentos: Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente2 (11), 60-70. https://revistascientificas.ifrj.edu.br/revista/index.php/alimentos/article/view/2061. Acesso em 26 de março de 2022.

BRASIL. Norma Regulamentadora 9: AVALIAÇÃO E CONTROLE DAS EXPOSIÇÕES OCUPACIONAIS A AGENTES FÍSICOS, QUÍMICOS E BIOLÓGICOS. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 10 mar. 2020. https://www.gov.br/trabalho-e-previdencia/pt-br/composicao/orgaos-especificos/secretaria-de-trabalho/inspecao/seguranca-e-saude-no-trabalho/normas-regulamentadoras/nr-09-atualizada-2021-com-anexos-vibra-e-calor.pdf. Acesso em: 11 Abril de 2022.

BRASIL, ANVISA. Portaria CVS 5, de 09 de abril de 2013. Regulamento técnico sobre boas práticas para estabelecimentos comerciais de alimentos e para serviços de alimentação. Brasília – DF, 2013.

BRASIL. Portaria SSST 25 de 1994: APROVA A NORMA REGULAMENTADORA Nº 9 – RISCOS AMBIENTAIS, E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 30 dez 1994. https://www.normasbrasil.com.br/norma/portaria-25-1994_180705.html Acesso em: 11 Abril de 2022.

Brasil (2014). Ministério da Saúde. Agência Nacional da Vigilância Sanitária. Resolução RDC n° 216, de 15 de setembro de 2004. Regulamento Técnico de Boas Práticas para Serviços de Alimentação. Brasília, DF. Disponível em: <https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/anvisa/2004/res0216_15_09_2004.html>. Acesso em 11 de Abril de 2022.

Fundada em 2020, a Agron tem como missão ajudar profissionais a terem experiências imersivas em ciência e tecnologia dos alimentos por meio de cursos e eventos, além das barreiras geográficas e sociais.

    1 Comment

  1. Avatar do Usuário
    Fabricia Nicomedes
    27/04/2022

    Excelente! Importante o trabalhador saber a que riscos ele está exposto.

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