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ANÁLISE DE DETERMINAÇÃO DA MELHOR ETAPA PARA A INSERÇÃO DE FARINHA DE INSETO NA PRODUÇÃO DE CERVEJA

Capítulo de livro publicado no livro do VIII ENAG E CITAG. Para acessa-lo  clique aqui.

DOI: https://doi.org/10.53934/9786585062046-32

Este trabalho foi escrito por:

Geiza Michelle Angelo Pacheco 1 * ; Renaly Kaline Gomes dos Santos2 ; Danilo Salustiano dos Santos3 ; Rogério Silva de Almeida4 ;Anderson Ferreira Vilela5 ; Arianne Dantas Viana6 ;  Raonne Roberto veríssimo da Silva7

 1,2,4,7Estudante do Curso de Bacharelado em Agroindústria – Campus III da UFPB;

 3Mestrando em Engenharia e Ciência de Alimentos – FURG; 5,6Docente/pesquisador – DGTA/CCHSA/UFPB

*Autor correspondente (Corresponding author) – Email: [email protected]

Resumo:  A Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO) prevê que até 2050 o mundo alcance mais de 9 bilhões de pessoas, com isso a indústria de alimentos sofre uma pressão para aumentar a produção de maneira sustentável e com qualidade. Deste modo a entomofagia que é a prática de consumo de inseto, é uma ótima alternativa, tendo em vista que possui várias vantagens. O que tem despertado o interesse de vários pesquisadores e da indústria de alimentos. Um setor que pode se beneficiar com essa matéria prima é o de cerveja artesanal, pois é um mercado que está aberto novas experiências sensoriais. Dentro desse contexto, objetivou-se neste trabalho produzir cerveja com farinha de inseto e avalia qual etapa do processamento é mais indicada para adição da farinha de tenébrio gigante (Zophobas morio) desidratado. As matérias primas para a produção da cerveja foram adquiridas de fornecedores da cidade de Recife- PE. Tanto a farinha, quanto a cerveja foram elaboradas no Laboratório de Pesquisa e Desenvolvimento de Bebidas do CCHSA/UFPB. Para averiguar qual momento do processo de elaboração de cerveja e o melhor para adicionar a farinha de inseto, foi avaliada duas alternativas a primeira inserir na etapa de fermentação e a segunda no processo de brassagem. Ao final da avaliação foi possível concluir que o momento mais indicado é dentro do processo de brassagem na etapa de fervura pois não interferem muito nas características da cerveja e  mais seguro para o consumidor.

Palavras–chave: Zophobas morio; Cerveja artesanal; Entomofagia; Brassagem

Abstract: The Food and Agriculture Organization of the United Nations (FAO) predicts that by 2050 the world will reach more than 9 billion people, so the food industry is under pressure to increase production in a sustainable way and with quality. Thus, entomophagy, which is the practice of insect consumption, is a great alternative, since it has several advantages. This has aroused the interest of several researchers and the food industry. One sector that can benefit from this raw material is craft beer, since it is a market that is open to new sensory experiences. Within this context, the present work aimed to produce beer with insect flour and evaluate which processing step is more indicated for the addition of dehydrated giant tener (Zophobas morio) flour. The raw materials for the production of beer were acquired from suppliers in the city of Recife-PE. Both the flour and the beer were elaborated in the Laboratory of Research and Development of Beverages from CCHSA/UFPB. To determine which moment of the brewing process is the best to add the insect flour, two alternatives were evaluated: the first is to insert it in the fermentation stage and the second in the brewing process. At the end of the evaluation it was possible to conclude that the best time is during the brewing process in the boiling stage because it does not interfere much in the beer characteristics and is safer for the consumer. 

Keywords: Zophobas morio; Craft beer; Entomophagy; Brewing

INTRODUÇÃO

Com o crescimento significativo da população mundial a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) prevê que até 2050 o mudo alcance mais de 9 bilhões de pessoas (1). O que ocasiona também uma maior demanda por alimentos e proteína alimentar, com isso surge a necessidade de buscar alternativas alimentares mais sustentáveis, com menor impacto ambiental e econômico (2)

O aumento da demanda de alimentos principalmente de produtos de origem animal, potencializou o desenvolvimento dos regimes intensivos de produção, tanto na pecuária como na aquicultura, para suprir as necessidades de procura de alimentos. Todavia, na produção de animais é necessário o consumo de inúmeros recursos naturais (água, extensões de terra, soja, milho, etc ) e esta  pode levar ao aparecimento de efeitos colaterais negativos como a emissão de metano para atmosfera,  poluição  de  solos  e  recursos  hídricos, além do desmatamento  para  formação  de  áreas  de pastagens e plantações   (3,4).

Com isso, a entomofagia que consiste no consumo de insetos por seres humanos, mostra-se uma ótima alternativa, visto que ela possui várias vantagens relacionadas ao meio ambiente, saúde, sociedade e ao valor nutricional que possuem, sendo ricos em diversos nutrientes, como cálcio, zinco, ferro, vitaminas do complexo B, proteínas e lipídios (5). A criação desses animais também proporciona vantagens como: baixa emissão de gases do efeito estufa, utilização de uma menor quantidade de água durante o sistema de produção, baixo risco de transmissão de zoonoses e uma conversão alimentar muito mais eficiente do que a de outros animais (6,7)

Nos últimos anos o consumo de insetos comestíveis vem atraindo a atenção da mídia, instituições de pesquisas, chefes de cozinha e outros membros da indústria de alimentos, além de legisladores e agências de regulamentação na área (8). Ganhando com isso, cada vez mais aceitação dos consumidores, o que desperta ainda mais o interesse por pesquisa e desenvolvimento de produtos alimentícios com farinha de insetos.

A farinha de inseto e rica em proteínas e em termos de composição de aminoácidos, muitos estudos mostram que a larva de tenébrio contém todos os aminoácidos essenciais em quantidades adequadas, por serem ricas em proteínas de alta qualidade, agregando um bom valor nutricional para uso como alimento (9).

 Um setor que pode se beneficiar com essa matéria prima é o de cerveja artesanal, que se caracterizam por serem produzidas em pequenas escalas e por meio de um processo de fermentação relativamente lento quando comparadas com as cervejas industriais mais populares (10). De acordo com estudos, algumas das principais motivações para o consumo de cerveja artesanal são a busca da autenticidade, novas experiências sensoriais e os atributos funcionais do produto (11). Segundo a Associação Brasileira de Cerveja Artesanal, entre as cinco maiores tendências para o mercado cervejeiro nacional estavam a utilização de riquezas dos biomas brasileiros e produção de cervejas de nicho com sabores diferenciados (12), ou seja, é um mercado que está disposto a experimentar algo novo.

Dentro desse contexto, o presente trabalho teve como objetivo estudar o uso de insetos na forma de farinha, como ingrediente para produção de cerveja, e avaliar em qual etapa do processamento de produção da cerveja é melhor para adição da farinha de tenébrio gigante (Zophobas morio) desidratado.

MATERIAL E MÉTODOS

AQUISISÃO DA MATÉRIA-PRIMA

Os insumos para produção de cerveja: levedura desidratada, maltes e lúpulo peletizado foram adquiridos de fornecedor comercial da cidade de Recife-PE. Juntamente com os insetos, no caso, os tenébrios gigantes (Zophobas morio), onde o produtor tem sua produção registrada no Ministério da Agricultura e possui autorização da ANVISA para essa comercialização.

MÉTODOS DE PREPARO                      

 A farinha de inseto e a cerveja foram elaborados no Laboratório de Pesquisa e Desenvolvimento de Bebidas do CCHSA/UFPB. Onde o processamento do inseto para a produção da farinha foi realizado em liquidificador doméstico em velocidade máxima. O liquidificador trabalhou como um moinho de martelos e foi balançado para promover a geração de uma farinha de granulometria mais regular. Após moída a farinha era peneirada, e a fração retida na peneira voltava para nova moagem junto com a nova carga de inseto desidratado íntegro. Já a produção de cerveja ocorreu pelas etapas descritas por Silva et al. (13), porém parte do malte moído foi substituído pela farinha de inseto. Pelo baixo conteúdo de carboidratos na composição dos insetos relatados na literatura científica, a troca de quantidade superior a 10% de malte de cevada por farinha de inseto poderia comprometer a qualidade da cerveja em termos fermentativos e na estabilidade da espuma por isso não se ultrapassou esse valor.

            Foram realizadas analises microbiológicas segundo a metodologia de APHA (14) da farinha de inseto, para avaliar em qual momento do processo de produção da cerveja era o melhor para adicionar a farinha, avaliando duas alternativas a primeira inserir na etapa de fermentação e a segunda no processo de brassagem.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

 Como não se sabia em qual fase do processo de produção deveria adicionar a farinha do inseto à formulação da cerveja, foi necessária uma avaliação. Partiu-se então à experimentação de qual etapa do processamento de produção da cerveja deveria inserir a farinha de tenébrio desidratado, sendo trabalhado com duas alternativas:

Alternativa 1 – colocar a farinha de inseto já na etapa de fermentação, maturação e/ou refermentação na garrafa. Esta alternativa poderia trazer grande benefício aromático para a bebida já que este potencial ingrediente não passaria pelas etapas conduzidas à quente e que teriam capacidade de evaporar princípios aromáticos voláteis, assim se manteriam no produto final. Por outro lado, a falta de uma etapa à quente poderia impedir a dissolução na bebida de componentes que só se dissolvem em temperaturas elevadas no mosto, principalmente pela elevada quantidade de lipídios que constitui o tenébrio desidratado na forma de farinha. Entretanto, a ideia de acréscimo do inseto na cerveja nas fases frias da produção foi logo descartada baseada no resultado do perfil microbiológico da farinha de inseto como pode ser visto na Tabela 1.

Como esse perfil demonstra que a farinha de tenébrio apresenta elevada carga microbiana não sendo segura para o consumo humano, onde a sua inserção na cerveja só seria possível se passasse por uma etapa de estabilização microbiológica. Como a proposta da cerveja formulada não é pasteurizada (chopp) a adição nas fases finais (frias) do processo da farinha de tenébrio se mostrou inviável por não trazer segurança ao consumo de acordo com os critérios internacionalmente conhecidos de Boas Práticas de Fabricação (BPF) e Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controle (APPCC).

Alternativa 2 – Colocar a farinha de inseto na etapa de brassagem.

Não devendo a farinha do inseto ser colocado nas etapas frias de produção devemos então,   adicionar o inseto durante a brassagem, onde o processamento das matérias-primas cervejeiras  se passam à quente. Mas, entre mosturação ou fervura do mosto, qual deveria ser a etapa escolhida?

Adição na mosturação: O uso do inseto nesta etapa pode promover uma hidrólise dos componentes proteicos e glicídicos do tenébrio adicionado, o que pode trazer benefícios, pelas diferentes frações proteicas e proteínas que tem propriedades benéficas à saúde como antitumorais, antioxidantes e outras. Mas também teria uma maior exposição de seus constituintes lipídicos à oxidação. Um teste piloto foi feito e contatou-se que a farinha de inseto sendo usada na etapa de mosturação trouxe atraso no tempo de sacarificação                                  do amido, uma desvantagem do ponto de vista operacional. Outra observação foi que a farinha                    de inseto se juntava à casca de malte se assemelhando a uma fina lama que embebia todo o bagaço. Essa última observação foi a definitiva no descarte da adição do inseto na mosturação, já que isso promovia uma filtração muito lenta (aumentando a oxidação do mesmo), produzindo  um mosto mais turvo (redução da qualidade da cerveja) e ainda trazendo uma menor geração de mosto (perda de rendimento).

Adição na fervura: Pela eliminação da possibilidade de inserção da farinha de inseto nas demais  etapas de produção da cerveja optou-se então pela adição da farinha de inseto na fervura do mosto, logo no início praticamente junto com a adição do lúpulo de amargor. Assim o mosto ferveu por 60 minutos na presença da farinha de inseto. A adição da nessa etapa mostra-se muito mais eficiente e segura.

CONCLUSÕES

Ao final das avaliações foi possível perceber que o uso da farinha de tenébrio gigante na produção de cerveja apresentou algumas restrições quanto ao momento de inserção ao longo do processamento do produto, não sendo seguro o uso nas fases frias do processo, por colocar em risco à saúde do consumidor devido a potencial presença microbiológica residual na cerveja. E que a melhor faze do processamento para adição da farinha é a brassagem na etapa de fervura do mosto, pois não interfere muito nas características e na qualidade da cerveja e ainda é mais seguro para o consumo.

AGRADECIMENTOS

Agradecemos a Universidade Federal da Paraíba -UFPB, campus III, pela infraestrutura que possibilitou essa pesquisa e ao CNPq pela política de incentivo à pesquisa.

REFERÊNCIAS

  1. FAO. Food and Agricultural Organization of the United Nations. Looking at edible insects from a food safety perspective. Challenges and opportunities for the sector. Rome: FAO. 2021.
  2. LÄHTEENMÄKI-UUTELA, A., RAHIKAINEN, M., CAMARENA-GÓMEZ, M. T., PIIPARINEN, J., SPILLING, K., e YANG, B. (2021, apr). European Union legislation on macroalgae products. Aquaculture International, 29(2), 487–509. DOI: 10.53934/9786585062046- 10.1007/s10499-020-00633-x
  3. COSTA, S. M. Proteínas de larvas de Tenebrio molitor (l., 1758): Extração, Caracterização e Aplicação num produto alimentar. 2017. p. 93. Universidade de Lisboa, Faculdade de Medicina Veterinária. Lisboa, 2017.
  4. TESTA, M.; STILO, M.; MAFFEI, G.; ANDRIOLO, V.; GORDOIS, P.; ZOTTI, C. M. Ungly but tasty: A systematic review of possible human and animal health risks related to entomophagy. NIH National Library of Medicine, Publmed.gov.Nov.2017.Disponívelem:https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/27008043/Acesso: 04 out 2022.
  5. SHELOMI, M. The meat of affliction: Insects and the future of food as seen, Trendsin Food Science & Technology, 56, p. 175-179, 2015 DOI: 10.53934/9786585062046- 10.1016/j.tifs.2016.08.004
  6. VILELLA, L. M. Produção de insetos para uso na alimentação animal. 2018. 69 f. Trabalho de Conclusão de Curso (grau de Zootecnista). Faculdade de Agronomia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2018.
  7. SOUSA, C. E. F.; MELO, D. C. F.; SANTANA, G. O. et al. Inserção de insetos na alimentação humana como alternativa nutricional. Instituto Federal de Educação, Ciência de Mato Grosso do Sul, Coxim, p. 1, 2017.
  8. VANHUIS,A.;VANITTERBEECK,J.;KLUNDER,H.;MERTENS,E.;HALLORAN,A.; MUIR, G.; VANTOMME, P. Edible Insects: Future Prospects For FoodAndFeed Security. 201 p., 2013. FAO Forestry Paper.
  9. AZAGOH, C. et al. Extraction and physicochemical characterization of Tenebrio molitor proteins. Food Research International, v. 88, p. 24-31, 2016
  10. CARVALHO,N.B.Cerveja artesanal:mercadológica e aceitabilidade sensorial [dissertação].Viçosa- MG :Universidade Federal de Viçosa, 2015.
  11. GÓMEZ CORONA, C.et al. Craft vs. industrial: Habits, atitudes and motivations towards beer consumption in Mexico.Appetite, London, v. 96, p.358-367, Jan. 2016. https://doi.org/10.1016/j.appet.2015.10.002
  12. ABRACERVA – Associação Brasileira de Cerveja Artesanal. O mercado da cerveja 2018. Disponível em:https://abracerva.com.br/category/mercado/. Acesso em: 04 out.2022
  13. SILVA, N.C; VILELA, A.F; VIANA, A.D; SILVA, S.X; OLIVEIRA, A.F; LUZ, K.S. Processamento de análise sensorial de cerveja artesanal do tipo “Blond Ale” com adição de jiló (Gilo Group), canela (Cinnamomum Verum) e sementes de coentro (Coriandrum sativum). In: SILVA, Natalia Costa da. Ciência e Tecnologia dos Alimentos. Belo Horizonte: Poisson, 2019. Cap. 10. p. 61-67.
  14. APHA. American Public Health Association. Compendium of methods for the microbiological examination of foods. 4th ed. Washington: APHA. p. 676z, 2001.

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