CONSUMO ALIMENTAR DE ESCOLARES: FATORES DETERMINANTES, CONSEQUÊNCIAS E ESTRATÉGIAS
Edylma Thaís da Silva Floriano1; Geíza Alves Azerêdo2
1Técnica em Nutrição e Dietética – CAVN – UFPB; E-mail: [email protected], 2Docente/pesquisadora do Departamento de Gestão e Tecnologia Agroindustrial – CCHSA – UFPB. E-mail: [email protected].
Resumo: A alimentação vem sendo estudada e relacionada ao processo saúde e doença e, com a expansão da indústria de alimentos, as práticas alimentares têm se tornado motivo de preocupação para os profissionais da nutrição, uma vez que essas escolhas têm sido fortemente influenciadas pela família, pela mídia, pela oferta e por todo um contexto social no qual o indivíduo está inserido. Estes fatores, isolados ou não, podem influenciar em escolhas inadequadas e acarretar doenças não transmissíveis desde o período da infância. Diante disso, o objetivo do estudo foi realizar uma revisão de literatura sobre o consumo alimentar de escolares, a fim de verificar quais são os determinantes que mais influenciam no seu consumo, discutir as consequências desse consumo no estabelecimento de relações socioafetivas e de aprendizado e registrar que estratégias estão sendo tomadas à luz da legislação e da ciência. Para isto, fez-se uma busca de artigos científicos nas bases de dados Google acadêmico e Scielo, publicados nos anos de 2011 a 2021. Nesse contexto, o consumo alimentar de escolares aponta para um cenário preocupante, visto que esses resultados podem repercutir nas demais fases da vida.
Palavras–chave: alimentação de crianças; nutrição; saúde
INTRODUÇÃO
A alimentação saudável deve tornar-se um hábito desde a infância, pois é fundamental para promover seu pleno crescimento e desenvolvimento (ALVES; CUNHA, 2020). Porém nas últimas décadas, em decorrência das grandes transformações sociais, que resultaram em mudanças no padrão de vida e no consumo alimentar, tem-se observado um aumento significativo do excesso de peso e obesidade em crianças em fase escolar, situações que apontam para um novo cenário de problemas relacionados à alimentação e à má-nutrição (BRASIL, 2017).
Segundo os dados da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), sobre o consumo de alimentos em ambiente doméstico, percebeu-se que os brasileiros reduziram o consumo de alimentos in natura, e essa redução ocorreu ao mesmo tempo em que a população aumentou o consumo de alimentos ultraprocessados (IBGE, 2017-2018), os quais são ricos em gorduras ou açúcares, apresentam alto teor de sódio, pouco teor de fibras sendo nutricionalmente desbalanceados.
Essas novas modalidades de produtos alimentícios atraem o consumidor porque facilitam o tempo de preparo das refeições, o armazenamento e a higienização que seria requerida para um alimento in-natura. Entretanto,o consumo em excesso de alimentos industrializados não só substitui o consumo de alimentos saudáveis, como contribui para o surgimento de doenças crônicas não transmissíveis (DCNTs), como obesidade, diabetes e hipertensão arterial, em virtude de sua composição química pobre nutricionalmente e rica açúcar refinado, sódio e gordura saturada (QUINONES et al., 2020).
Ademais, a inclusão desses alimentos tem sido verificada nos lanches dos escolares, como apontam os dados de que 40 mil crianças brasileiras de cinco a dez anos, segundo o Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (SISVAN), consomem frequentemente biscoitos salgados e salgadinhos de pacote; biscoitos doces e recheados, doces, balas e chocolates, além de refrigerantes, os quais possuem alta quantidade de açúcar e gordura, sendo altamente calóricos (RUSCHEL et al., 2016).
Diante deste cenário, buscou-se verificar quais são os determinantes que mais influenciam no consumo alimentar de escolares, discutir as consequências desse consumo no estabelecimento de relações socioafetivas e de aprendizado e registrar que estratégias estão sendo tomadas à luz da legislação e da ciência.
DETERMINANTES NA ESCOLHA DOS ALIMENTOS
Os hábitos alimentares são formados na infância, daí a necessidade de uma boa alimentação nesse período, pois pode repercutir durante toda a vida e prevenir doenças. Diante do exposto, é necessário o entendimento dos fatores que influenciam nesse processo de escolha dos alimentos.
Segundo Melo et al. (2017), os pais possuem importante papel na formação do hábito alimentar infantil, sendo os principais responsáveis pelas escolhas alimentares, tanto em relação à quantidade, quanto à qualidade dos alimentos dados à criança. A influência dos pais vem também de seus exemplos de consumo e estado nutricional, indicando que pais que apresentavam um peso elevado tiveram filhos com excesso de peso (SILVA et al., 2019).
O ambiente sobre o qual o indivíduo está inserido é outro determinante do comportamento alimentar. Neste sentido, a escola se enquadra como um espaço decisivo da construção de condutas, pois propicia a convivência, interação social e o aprendizado, tornando assim, um espaço ideal para que ações de promoção à alimentação saudável sejam desenvolvidas (SOUZA; CADETE, 2017). Deve ser mencionado também o nível de escolaridade da família, que vem aumentando gradativamente, e consequentemente o poder aquisitivo de compra, e isso vem refletindo nos hábitos alimentares de forma inadequada, pois pais com mais anos de estudo tem mais propriedade de discernir entre o que é considerado de fato alimento saudável (MOLINA et al., 2010).
Outro fator de grande importância que reflete na alimentação infantil é a mídia, que se faz presente não só na publicidade televisiva, como nas embalagens dos alimentos industrializados. A propaganda utiliza da capacidade de persuasão e atinge, especialmente, as classes sociais menos favorecidas e crianças, vulneráveis e carentes de informação (MONTE, 2011). Por sua vez, a criança, convencida de que deve consumir aquele produto, passa a exercer sobre seus pais o poder da sua vontade (MEDEIROS, 2019).
Há de se considerar também o local de venda, uma vez que a disposição dos produtos nas prateleiras pode favorecer que os produtos, já com seus rótulos coloridos e ilustrados de desenhos, possam ser vistos rapidamente, principalmente por crianças (SOARESet al., 2013). Cabe ainda mencionar que o ato de assistir televisão durante horas por dia faz parte da rotina de inúmeras crianças, fato que se torna preocupante devido aos comerciais publicitários, que influenciam a imaginação e despertam desejos.
CONSEQUÊNCIAS DE UM CONSUMO ALIMENTAR INADEQUADO E AS ESTRATÉGIAS QUE VÊM SENDO TOMADAS PELO PODER PÚBLICO
Conforme estudo realizado por Abarca-Gómez et al. (2017), liderado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), estima-se que a obesidade em crianças e adolescentes (de cinco a 19 anos) em todo o mundo aumentou dez vezes nas últimas quatro décadas. Se não houver mudança neste cenário, haverá mais crianças e adolescentes com obesidade do que com desnutrição moderada e grave até 2022.
Esses dados são preocupantes, pois o excesso de peso e a obesidade são fatores de risco para as doenças crônicas não transmissíveis (DCNTs), como doenças cardiovasculares, disfunções metabólicas, dislipidemia e dificuldades motoras (JARDIM; SOUZA, 2017). Alguns desses aspectos foram comprovados por Carvalhal e Coelho (2013), que verificaram que crianças obesas apresentaram atraso no desenvolvimento motor e na aprendizagem.
Crianças obesas também apresentam problemas de ordem psicológica, como timidez excessiva, sentimento de incapacidade, tendência ao isolamento, baixa autoestima, depressão. Além disso, estar acima do peso deixa o indivíduo suscetível ao bullying, estigmatizado e à margem das relações sociais (SANTOS, 2021; PAINI, 2018), fruto de uma sociedade que tem valores pautados em um padrão de beleza imposto pela mídia.
Como um contraponto a esse cenário, foi elaborado o Guia alimentar para a população brasileira, com diretrizes oficiais para a promoção da alimentação adequada e saudável (BRASIL, 2014). Este guia tem um papel fundamental na construção de políticas públicas voltadas para alimentação e nutrição e é considerado uma das ferramentas de educação alimentar e nutricional no combate a obesidade e excesso de peso (BORTOLINI, 2019).
Ademais, no Brasil existem as leis que regulamentam a publicidade de alimentos e bebidas direcionadas ao público infantil, podendo citar a Lei 13.583/2016, que proíbe a publicidade de alimentos e bebidas pobres em nutrientes e com alto teor de açúcar, gorduras saturadas ou sódio direcionada ao público infantil (CFN, 2021).
CONCLUSÕES
A alimentação infantil está associada ao processo que irá repercutir ao longo da vida, portanto faz-se necessário a participação dos pais para um autocuidado e compreensão na construção dos hábitos alimentares e melhor qualidade de vida, sendo considerados a primeira influência para os filhos. A escola, por sua vez, é o principal centro de formação do educando e deve ser espaço de tematização, para discutir com os alunos e a comunidade escolar a influência da mídia e a importância de uma educação alimentar e nutricional, para prevenção de agravos nutricionais.
REFERÊNCIAS
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BRASIL. IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa de orçamentos familiares 2017-2018.
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