Utilização de checklist na gestão de segurança de dietas enterais: ainda funciona?
Autores: Gisela Silva da Costa1, Elaine de Oliveira Pinto2, Larissa Dias Campos3, Sérgio Thode Filho4. Todos do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro, Mestrado em Ciência e Tecnologia de Alimentos (PCTA/IFRJ).
Estudos apontam que a oferta nutricional adequada é de suma importância, principalmente no paciente hospitalizado, de forma a evitar a desnutrição, a deficiência de vitaminas e minerais e aumentar a adequação ao tratamento médico. Diante disso, alguns pacientes em decorrência de suas patologias ou do tratamento delas, não conseguem se alimentar na totalidade do seu valor energético diário estimado pela via oral, necessitando de uma alimentação por sonda. Considera-se a terapia nutricional enteral (TNE) indicada, desde que o trato gastrintestinal esteja funcionante, essa dieta apresenta vantagens de ser mais fisiológica, ajudando na manutenção da função e estrutura da mucosa intestinal.
Porém, além da preocupação com a desnutrição, outra questão a ser analisada é a segurança do alimento. A contaminação microbiológica pode gerar sérios problemas à saúde do consumidor. Na área hospitalar, esta preocupação é ainda maior, pois os pacientes apresentam enfermidades que podem comprometer o sistema imune, necessitando de um maior cuidado na assepsia da dieta. Pesquisas sugerem que a TNE sistema aberto apresenta maior possibilidade de adequação das necessidades nutricionais do paciente devido à possibilidade de modulação de nutrientes, atuando como coadjuvante no tratamento médico.
Neste sentido, devido à maior manipulação dessas formulações e à grande oferta de nutrientes presentes nelas, essas dietas apresentam risco de contaminação na sua confecção. Por isso, é necessário garantir as boas práticas de segurança e higiene dos produtos. Em relação a TNE, existem legislações específicas que devem ser consideradas para o implemento das boas práticas. De acordo com a RDC 63, a dieta enteral sistema aberto necessita de uma área restrita e específica seguindo as boas práticas de manipulação. Contudo, não podemos esquecer que o conforto ambiental é um fator determinante na eficiência da segurança do alimento, sendo importante uma integração conjunta com a segurança ocupacional para as boas práticas de manipulação.
Adicionalmente, sabe-se que a organização ambiental tem influência direta na produtividade. A temperatura e umidade ambiente quando inadequadas, causam desconforto, diminuindo a atenção e a produtividade dos colaboradores. Além disso, o aumento da temperatura pode levar ao aumento de partículas corporais aumentando a proliferação de bactérias no ambiente, a umidade ambiente elevada pode aumentar o crescimento de fungos, além do risco de acidentes devido à umidade do chão e das paredes.
Outro item que merece atenção é a falta de manutenção de equipamentos que podem colocar em risco a saúde do trabalhador e das dietas, equipamentos sem manutenção aumentam os ruídos, causando desconforto aos manipuladores, utensílios desgastados podem propagar o crescimento de microrganismos devido à dificuldade de higienização, da mesma forma, a falta de manutenção de paredes, pisos e teto contribuem para a proliferação fúngica e microbiológica.
Em virtude disso, o controle das etapas de produção das dietas tem que ser rigoroso, os indicadores de qualidade estabelecem uma relação de vigilância e monitoramento em busca de melhores resultados na segurança do trabalhador e na assistência nutricional do paciente. Dessa forma, a utilização do checklist (lista de verificação) pode ser eficaz no gerenciamento da qualidade das dietas e da saúde ocupacional dos trabalhadores. Até porque tudo passa pelo manipulador. O checklist é um método rápido, de baixo custo, prático e de grande valia para gestão. Essa ferramenta de auxílio ao trabalho é usada para reduzir falhas, realizado diariamente ajuda no controle dos agentes ambientais, no conforto térmico, lumínico, acústico, psicológico, evitando falhas no processamento e garantindo uma boa qualidade do produto final.
Um estudo realizado em um Hospital Federal no Rio de Janeiro analisou a aplicação do checklist no centro de manipulação de dietas enterais com base na legislação sanitária federal, Resolução nº216/2004, para garantir um ambiente confortável e seguro para os manipuladores e a qualidade do produto final. Foram analisados os seguintes parâmetros: umidade relativa do ar, temperatura ambiente, manutenção preventiva dos equipamentos e predial, uso de EPI´s, higiene do ambiente laboral e do manipulador, permitindo com essa ferramenta a verificação diária, o controle e ações de correção das condições ambientais.
O checklist utilizado para avaliação do conforto ambiental conforme RDC nº216 em relação ao bloco das manipuladoras estão descritos no quadro abaixo. Os parâmetros eram avaliados com frequências distintas segundo o seu grau de prioridade e necessidade. Além disso, existia um plano de ação particularizado e uma meta a ser atingida que variava de 90 a 100% de conformidade. Dentre os parâmetros analisados: umidade e temperatura ambiente, condições de higiene ambiental e pessoal, manutenção predial e dos equipamentos e uso dos EPI´s.
Os dados apontaram que a verificação diária e as ações corretivas permitiram a segurança na manipulação contribuindo para a eficácia das atividades laborais, além da segurança ocupacional, garantindo a qualidade das dietas.
De maneira geral, percebeu-se nesse estudo que esse setor apresentava um baixo índice de absenteísmo e licenças, sugerindo que o conforto ambiental é de extrema importância para o bom desempenho do trabalhador na execução de suas funções, sugerindo que essas medidas atuam no incentivo dos trabalhadores evitando também falhas no processo que podem ocasionar uma possível contaminação alimentar.
Sobre os autores:
1Gisela Silva da Costa: Nutricionista, mestranda do Programa de Pós-Graduação em Ciência e Tecnologia de Alimentos e especialista em nutrição clínica pela Universidade São Camil. Tem experiência em produção, terapia nutricional, lactário e nutrição clínica. É servidora desde 2015 no Instituto Nacional de Câncer, atuando no Centro de manipulação das dietas enterais e lactário e na assistência dos pacientes oncológicos.
2Elaine de Oliveira Pinto: Graduada em Nuntrição pela Universidade Federal Fluminense. Tem residência em nutrição institucional do Hospital Universitário Pedro Ernesto. Desde 01/05/2017 faz parte do quadro da chefia da Dinutri do Hospital Universitário Pedro Ernesto, na parte de alimentação coletiva, sendo responsável pelo sistema de prescrição nutricional, faturamento, e supervisão da equipe de fiscalização da produção de alimentos para pacientes internados. Mestranda em Ciência e Tecnologia de Alimentos pelo IFRJ. Formada no curso superior de tecnologia em Sistemas de Computação pela UFF.
3Larissa Dias Campos: Nutricionista, mestranda em Ciência e Tecnologia de Alimentos pelo IFRJ e especialista em Vigilância Sanitária e Qualidade de Alimentos e em Saúde Pública. É Auditora Interna em Segurança de Alimentos na Norma ISO 22000:2018 e Auditora Interna em Sistemas de Gestão Integrado nas Normas ISO9001:2015, ISO 14001:2015 e ISO45001: 2018.
4Sérgio Thode Filho: Professor associado (D402) no Departamento de Alimentos do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro (IFRJ). Docente permanente do Programa de Pós-Graduação em Ciência e Tecnologia de Alimentos (PCTA/IFRJ). Pós-Doutorado em Recursos Naturais e Proteção Ambiental pelo Programa de Pós-Graduação Binacional em Ciência, Tecnologia e Inovação em Agropecuária (PPGCTIA/UFRRJ) e Universidad Nacional de Rio Cuarto, Argentina (UNRC). Doutor em Ciências (Ecotoxicologia – Avaliação de Impacto via Organismos Aquáticos, Terrestres e Vegetais) pelo Programa de Pós-Graduação em Meio Ambiente (PPGMA/UERJ). Mestre em Sistemas de Gestão Integrada (Ambiente, Qualidade, Saúde e Segurança do Trabalho) pelo Laboratório de Tecnologia, Gestão de Negócios e Meio Ambiente (LATEC/UFF). MBA em Engenharia da Qualidade (LATEC/UFF), Especialista em Saúde e Segurança do Trabalho e Segurança de Alimentos (FAMEESP). Bacharel em Administração de Empresas pela FBC, Licenciado em Ciências Biológicas pela UNIFRAN. Coordenador do Laboratório Multidisciplinar de Gerenciamento de Resíduos (LMGR), atuando com Ecotoxicologia Aplicada, Síntese de Biomateriais e Toxicologia Ocupacional e Análise de Risco. Colaborador dos Programas de Pós-Graduação em Ciência e Tecnologia de Polímeros do Instituto de Macromoléculas Eloisa Mano (PPGCTP/UFRJ-2014) e em Informática (PPGI/UFRJ-2020). Associate Editor do Brazilian Journal of Experimental Design, Data Analysis and Inferential Statistics (www.bjedis.org).
Referências:
da Costa, G. S., Feijó, P. M., Aquino, C. R. C., de Oliveira Pinto, E., Campos, L. D., Rodrigues, Y. G., & Thode Filho, S. (2022). DIETAS ENTERAIS MANIPULADAS: PARÂMETRO DE QUALIDADE E RISCOS AMBIENTAIS. Alimentos: Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente, 2(11), 50-59. Disponível em: <https://revistascientificas.ifrj.edu.br/revista/index.php/alimentos/article/view/2060.>. Acesso em 27 de março de 2022.
de Oliveira Pinto, E., Aquino, CRC, da Costa, GS, Campos, LD, Rodrigues, YG, & Thode Filho, S. (2022). Levantamento de riscos ambientais em uma cozinha industrial. Alimentos: Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente, 2 (11), 60-70. https://revistascientificas.ifrj.edu.br/revista/index.php/alimentos/article/view/2061. Acesso em 26 de março de 2022.
Brasil. (2000). Ministério da Saúde, Resolução da Diretoria Colegiada nº 63. Aprova o Regulamento Técnico para fixar os requisitos mínimos exigidos para a Terapia de Nutrição Enteral. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Poder Executivo, Brasília, DF, 06 de julho de 2000. <https://www.saude.mg.gov.br/index.php?option=com_gmg&controller=document&id=9879-resolucao-anvisa-dc-n-63-de-25-de-novembro-de-2011>. Acesso 30 de março de 2022.
Brasil (2014). Ministério da Saúde. Agência Nacional da Vigilância Sanitária. Resolução RDC n° 216, de 15 de setembro de 2004. Regulamento Técnico de Boas Práticas para Serviços de Alimentação. Brasília, DF. Disponível em: <https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/anvisa/2004/res0216_15_09_2004.html>. Acesso em 27 de março de 2022.