Produção de queijo minas sustentável: o que temos de novidade?
Autores: Thaís Cristina Mendes da Silva¹, Sérgio Thode Filho², Adriano Gomes Cruz³. Todos do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro, Mestrado em Ciência e Tecnologia de Alimentos (PCTA/IFRJ).
A indústria leiteira possui grande relevância no agronegócio brasileiro, exercendo um importante papel econômico e social no país, devido à geração de empregos, rendas e tributos ao Estado. Quase metade da produção anual é transformada em produtos lácteos, sendo os principais: queijo, iogurte, leites fermentados, sobremesas lácteas, doce de leite, além do creme de leite e seus derivados, como a manteiga.
A sua fabricação pode ser dividida em três etapas distintas: acidificação, coagulação e desidratação. A acidificação é a etapa de fermentação da lactose pelas bactérias láticas com produção de ácido lático. Na coagulação, ocorre a formação de um gel, a coalhada. A desidratação consiste em todas as etapas seguintes à coagulação, como corte, mexedura, aquecimento, prensagem, salga e maturação. O objetivo é retirar o soro da coalhada e atingir o teor de umidade desejado no queijo, sendo o produto final um concentrado das proteínas e gorduras do leite.
Na fabricação de 1 kg de queijo minas, são necessários cerca de dez litros de leite, com recuperação de nove litros de soro. Sendo estimado então, que no ano de 2021 tivemos uma sobra de 1 bilhão de litros de soro.
O soro do leite, pode conter aproximadamente 55% dos nutrientes do leite, sendo composto por água (93%), lactose (5%), proteínas de alto valor biológico (0,85%), uma quantidade mínima de gordura (0,36%) e minerais (0,53%), vitaminas (principalmente do Complexo B). Também contém ácido lático (0,5g L-1) e ácido cítrico, compostos nitrogenados não-proteicos (ureia e ácido úrico).
Diante do exposto, há uma importante preocupação em gerar aplicabilidade do soro em novos alimentos, uma vez que o desperdício irá gerar impacto nutricional, financeiro e ambiental expressivos.
Ademais, pelo seu elevado valor nutricional, o poder poluente do soro é aproximadamente 100 vezes maior que o esgoto doméstico, sendo prejudicial à vida aquática, se lançado em cursos d’água, devido à demanda bioquímica de oxigênio (30.000mg a 50.000mg de oxigênio/litro de soro) e, nocivo ao solo, por alterar sua composição físico-química, diminuindo o rendimento da colheita.
No entanto, o tratamento do soro de leite possui custo elevado e, até a década de 1960, grandes partes das empresas lançavam seus resíduos na natureza, sem nenhuma preocupação ambiental. Porém este cenário mudou ao final dos anos 90, pois surgiram leis e normas internacionais para um controle dos danos ao meio ambiente. Um exemplo foi a Avaliação do Ciclo de Vida (ACV), que é um método utilizado para avaliar um produto ou processo, desde a obtenção da matéria-prima até a eliminação de seus resíduos (ABNT, 2009).
Junto a isso, surgiu uma emergente preocupação mundial com a sustentabilidade ambiental, despertando o interesse na reutização deste rico subproduto em alimentos. As principais alternativas apresentadas pela literatura é a produção de bebidas lácteas (acrescida de frutas) e suplementos alimentares, sendo esta a mais conhecida, devido ao maçante marketing do universo fitness, chegando a popularizar o soro do leite pelo seu termo em inglês, Whey Protein.
O avanço tecnológico no setor de alimentos e a agregação de valor devido à elevada qualidade nutricional do soro, também tem incentivado a pesquisa e o surgimento de novos produtos, por parte das grandes indústrias de alimentos. Atualmente, já se pode encontrar sorvetes, biscoitos, chocolates, barrinhas de cereais, suplementos alimentares para fins clínicos e até releituras de produtos já conceituados no mercado.
Outra tendência, que vem acontecendo nos países desenvolvidos, é a produção de bebidas alcoólicas destiladas a partir do soro do leite, sendo inclusive premiadas no mundo.
Logo, com base nesta diversidade de novos produtos alimentares, a pesquisa com soro de leite é um tema em ascensão, sendo promissor para o produtor e benéfico para o meio ambiente, por tornar a produção de queijo um ciclo sustentável.
Sobre os autores:
¹Thaís Cristina Mendes da Silva: Nutricionista, mestranda do Programa de Pós-Graduação em Ciência e Tecnologia de Alimentos e especialista em Nutrição funcional, ortomolecular e biofuncional, pela Faculdade Redentor. Residência em Nutrição clínica, pelo Hospital Universitário Pedro Ernesto. Experiência em terapia nutricional, nutrição clínica e cirúrgica. Servidora pública, desde 2021, atuando no Instituto de Endocrinologia e Diabetes do Rio de Janeiro.
²Sérgio Thode Filho: Professor Associado (D402) no Departamento de Alimentos do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro (IFRJ). Docente permanente do Programa de Pós-Graduação em Ciência e Tecnologia de Alimentos (PCTA/IFRJ). Pós-Doutorado em Recursos Naturais e Proteção Ambiental, Doutor em Ciências, Mestre em Sistemas de Gestão Integrada (Ambiente, Qualidade, Saúde e Segurança do Trabalho), Higienista Ocupacional, Administrador e Biólogo. Ensino e Pesquisa em Gestão de Segurança Ocupacional e Qualidade em UAN’s, Avaliação de Impacto Ambiental e Síntese de Biomateriais
³Adriano Gomes Cruz: Professor associado (D42) no Departamento de Alimentos no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro (IFRJ). Doutorado e Pós-Doutorado em Tecnologia de Alimentos pela Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Coordenador do Laboratório de Processamento de Alimentos e Laboratório de Análise Sensorial, pertencentes do Departamento de Alimentos/IFRJ. Atualmente é Coordenador do Mestrado Profissional de Ciência e Tecnologia de Alimentos do IFRJ
Referências:
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