ELABORAÇÃO E ACEITAÇÃO SENSORIAL DE PRODUTOS DE CEREAIS ISENTOS DE GLLÚTEN UTILIZANDO RESÍDUO DE GOIABA
Capítulo de livro publicado no livro do VIII ENAG E CITAG. Para acessa-lo clique aqui.
DOI: https://doi.org/10.53934/9786585062046-26
Este trabalho foi escrito por:
Ana Paula Costa Câmara *; Lupercio Luizines Cavalcanti Filho ; Karine Silva Costa ; Maria Fernanda de Oliveira Gomes ; Luma Emmanuelly Da Silva Ribeiro
*Email: [email protected]
Resumo: Os resíduos agroindustriais possuem elevado potencial de serem reutilizados em vários processos, destacando-se como uma estratégia para agregar mais valor aos produtos alimentícios. Dada a grande flexibilidade que a formulação de barras de cereais possui, o produto apresenta-se como uma das alternativas para incluir os resíduos agroindustriais na alimentação, de forma viável e saudável. O mercado de biscoitos no Brasil apresenta-se em crescimento e capaz de desenvolver novos produtos a população com restrições alimentares. Estima-se que haja no Brasil hoje aproximadamente 2 milhões de celíacos, porém a grande maioria ainda não tem diagnóstico. Este estudo buscou utilizar o resíduo do processamento da polpa congelada de goiaba na elaboração de biscoitos isentos de glúten e barra de cereal avaliando os atributos sensoriais e intenção de compra. Para o biscoito aplicou-se o método direto seco para a preparação da massa, que após modelada foi assada a 150 °C por 15 minutos, e a barra de cereal elaborada utilizando-se a máquina de barra de cereal – nutritive cereal maker da marca Mallory. Na avaliação sensorial, os produtos com adição do resíduo de goiaba atingiram índices de aceitabilidade satisfatórios, na intenção de compra mais de 50 % dos provadores afirmaram que comprariam os biscoitos e 50 % também responderam que comprariam a barra de cereal elaborada. Conclui-se que é possível o desenvolvimento de novas formulações de produtos de cereais, como barras, assim como biscoitos para os celíacos com boas qualidades sensoriais, por meio de uma produção sustentável, garantindo recursos para as gerações futuras.
Palavras–chave: cereal; celíaco; goiaba; resíduo; sustentabilidade
Abstract: Agroindustrial waste has a high potential to be reused in various processes, standing out as a strategy to add more value to food products. Given the great flexibility that the formulation of cereal bars has, the product presents itself as one of the alternatives to include agro-industrial residues in food, in a viable and healthy way. The biscuit market in Brazil is growing and capable of developing new products for the population with dietary restrictions. It is estimated that in Brazil today there are approximately 2 million celiacs, but the vast majority are still undiagnosed. This study sought to use the residue from the processing of frozen guava pulp in the preparation of gluten-free cookies and cereal bar, evaluating the sensory attributes and purchase intention. For the biscuit, the direct dry method was applied for the preparation of the dough, which after modeling was baked at 150 °C for 15 minutes, and the cereal bar prepared using the cereal bar machine – nutritive cereal maker of the brand Mallory. In the sensory evaluation, the products with the addition of guava residue reached satisfactory acceptability indices, in the purchase intention more than 50% of the tasters said they would buy the cookies and 50% also answered that they would buy the elaborate cereal bar. It is concluded that it is possible to develop new formulations of cereal products, such as bars, as well as cookies for celiacs with good sensory qualities, through sustainable production, guaranteeing resources for future generations.
Keywords: cereal; celiac; guava; residue; sustainability
INTRODUÇÃO
A fruta é consumida in natura ou processada na forma de compotas, sorvetes, sucos, doce de corte, devido a suas propriedades nutricionais, sensoriais e funcionais. A alta taxa de respiração da goiaba acarreta na diminuição da vida útil pós-colheita, consequentemente contribui para as perdas do produto. O processamento de polpas de frutas congeladas é destaque como uma alternativa para redução das perdas e um aproveitamento das frutas (1).
O elevado índice de desperdício e a preocupação com os impactos ambientais, gerados pelas indústrias de alimentos, têm levado à busca de aplicações viáveis desses resíduos para o desenvolvimento de novos produtos, nesse sentido, as indústrias alimentícias buscam alternativas de aproveitamento e elaboração de novos produtos saborosos e nutritivos, ao mesmo tempo que evitam os desperdícios provocados pela cadeia produtiva (2).
Na formulação dos alimentos, os resíduos podem ser transformados em farinha ou serem acrescentados “in natura”, sendo aplicado como matéria-prima para a produção de novos produtos com valor nutricional agregado, ampliando a possibilidade da oferta de alimentos mais saudáveis, com baixo custo, e contribuindo para o desenvolvimento agroindustrial, com destaque na redução das perdas (3).
A substituição parcial ou total da farinha de trigo em produtos de panificação e afins vem sendo estudada largamente, devido ao aumento de casos de pessoas que possuem algum tipo de intolerância ou alergia ao glúten (4), como a Doença Celíaca (DC) que é a intolerância à ingestão de glúten, presente em cereais como centeio, malte, cevada e trigo, em indivíduos geneticamente predispostos (5).
Ainda não existe no Brasil um estudo multicêntrico que defina a prevalência da Doença Celíaca. Com base na prevalência mundial a FENACELBRA (Federação Nacional das Associações de Celíacos do Brasil) estima que haja no Brasil hoje aproximadamente 2 milhões de celíacos, sendo que a grande maioria ainda não tem diagnóstico.
As barras de cereais são elaboradas por meio da extrusão da massa de cereais de sabor adocicado e agradável, são fontes de fibras, vitaminas, sais minerais, proteínas e carboidratos digestíveis (6). São produtos multicomponentes, constituídos de cereal (aveia), frutas secas e xarope aglutinador, podendo-se adicionar as partes consumíveis e/ou os resíduos de frutas e vegetais que usualmente não são aproveitadas e que possuem um alto valor nutritivo, diminuindo assim o desperdício de alimentos (7). A maior dificuldade de obtenção de uma boa barra de cereal é a combinação dos diversos ingredientes com funcionalidade específica tais como vitaminas, minerais, proteínas, grãos, fibras, agentes espessantes, adoçantes e aromatizantes, e transformá-los em um produto com sabor, textura e aparência aceitáveis, ao mesmo tempo em que se almeja objetivos nutricionais específicos (7).
De acordo com Araújo e colaboradores (8), os celíacos relatam que a oferta de alimentos sensorialmente apropriados é restrita, o que torna a dieta monótona. Para Nascimento e Franco (9), desenvolver produtos alimentícios sem glúten com adequada qualidade sensorial, com potencial para promover melhoras nos cuidados de saúde e na qualidade de vida de pessoas com doença celíaca, além de representar um importante desafio tecnológico, é importante questão de pesquisa.
Nesse contexto, este trabalho teve como objetivo aplicar o resíduo do processamento da polpa congelada de goiaba na elaboração de dois produtos de cereais isentos de glúten, uma barra de cereal e um biscoito, em seguida avaliar sensorialmente a aceitabilidade e intenção de compra dos produtos, visando reduzir o desperdício desses resíduos, como também contribuir para o desenvolvimento de novos produtos alimentícios para o público celíaco.
MATERIAL E MÉTODOS
Os ingredientes para elaboração dos produtos foram adquiridos no comércio local do município de Macaíba-RN. O resíduo agroindustrial, do processamento do fruto da goiaba na forma de polpa congelada, proveniente da Unidade de Processamento de Frutas e Hortaliças da Agroindústria da EAJ – Escola Agrícola de Jundiaí – UFRN, foi fornecido desidratado na forma de pó para ser utilizado como matéria prima na elaboração da barra de cereal e do biscoito. As formulações foram produzidas respeitando-se as normas comerciais estabelecidas pela Comissão Nacional de Normas e Padrões para Alimentos, fabricados a partir de matérias-primas limpas, isentas de parasitas e em perfeito estado de conservação (10).
ELABORAÇÃO DO BISCOITO
Os ingredientes utilizados na elaboração do biscoito foram empregados de acordo com as proporções descritas na Tabela 1. Onde a farinha mista utilizada foi constituída de farinha de arroz e fécula de mandioca na proporção de 2:1, a quantidade de resíduo adicionado correspondeu a 20 % em função da quantidade de farinha mista usada e os demais ingredientes correspondentes ao peso total da massa. A produção dos biscoitos ocorreu na Padaria da Escola Agrícola de Jundiaí – UFRN.
Ao início da produção, foi realizada a sanitização das superfícies que seriam utilizadas, além da separação e a pesagem dos insumos a serem utilizados. Posteriormente, ocorreu a mistura do material em uma batedeira com sistema de rotação planetário, empregando-se batedores do tipo gancho, de modo a garantir uma homogeneidade na massa. O método de mistura aplicado foi o método direto seco, no qual a mistura dos ingredientes ocorre de uma só vez.
Após a mistura, ocorreu a homogeneização e a abertura da massa. Para uma homogeneização da forma e tamanho dos biscoitos, foram utilizados rolo para massa e uma bancada de granito, além de moldes circulares, de 4 cm de diâmetro, para modelagem. Em seguida, os biscoitos foram colocados em bandejas cobertas com papel manteiga (Figura 1), e levados ao forneamento, o qual ocorreu a 150 ºC por aproximadamente 15 minutos. Logo após o forneamento, ocorreu o resfriamento à temperatura ambiente e acondicionamento em recipientes plásticos herméticos.
ELABORAÇÃO DA BARRA DE CEREAL
A Tabela 2 contém a formulações da barra de cereal produzida, onde a com resíduo de goiaba. Para a produção fez-se primeiro a mistura dos ingredientes secos e em seguida a adição dos aglutinadores, a cocção do produto realizada com a utilização da máquina de barra de cereal – nutritive cereal maker da marca Mallory, conforme ilustra a Figura 2. As amostras da barra de cereal foram elaboradas no Laboratório de Agroindústria do CVT – Centro Vocacional Tecnológico da EAJ.
AVALIAÇÃO SENSORIAL
A avaliação sensorial foi realizada com 40 provadores não treinados, frequentadores da Escola Agrícola de Jundiaí/UFRN, com faixa etária de 15 a 43 anos, os quais avaliaram o produto final por métodos afetivos. Antes da análise, os participantes assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), o qual apresentava o objetivo da pesquisa, indicando os componentes dos produtos em questão e, ainda, atestando a participação voluntária do julgador.
A análise ocorreu em dois momentos, primeiro os julgadores receberam a amostra de um terço (quadrado com 3 cm de lado) da barra de cereal pesando 11 g cada, e aplicou-se o teste afetivo com os atributos: aparência, textura, sabor, aroma e impressão global. Os julgadores foram orientados a provar a amostra e avaliar por meio de escala hedônica de nove pontos, no qual o ponto 1 refere-se a “desgostei muitíssimo” e o ponto 9 “gostei muitíssimo” aplicando a metodologia de Faria e Yotsuyanagi (11). Para o teste de intenção de compra adotou-se uma segunda escala hedônica estruturada em cinco pontos, nos quais os pontos extremos são: “Certamente não compraria” (1) e “Certamente compraria” (5).
No segundo momento os provadores realizaram a avaliação sensorial do biscoito, onde avaliaram a aceitabilidade do produto quanto a três conjuntos de atributos, os quais apresentavam uma escala estruturada por cinco pontos, mas com variáveis distintas. O primeiro conjunto era referente apenas ao atributo aroma, com as seguintes atribuições: 1-ausente; 2-fraco; 3-moderado; 4-forte; 5-intenso. Em relação ao segundo conjunto, tratava-se dos atributos aparência, textura e sabor, sendo julgados por: 1-péssima; 2-ruim; 3- média; 4-boa; 5-ótima. Tratando-se do terceiro conjunto, esse levava em consideração a impressão global do produto, com as atribuições: 1-desgostei muito; 2-desgostei ligeiramente; 3-indiferente; 4-gostei ligeiramente; 5-gostei muito. Avaliou-se a intenção de compra conforme uma escala estruturada em três pontos (1- não compraria, 2-talvez comprasse, 3-compraria).
Para os dois produtos calculou-se o Índice de Aceitabilidade (IA), IA (%) = A x 100/B, sendo A = nota média obtida e B = nota máxima obtida. Para interpretação dos dados da intenção de compra, foram realizados cálculos de percentual. Quando o IA é ≥ 70% considera-se que o alimento possui boa aceitação (12).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A análise sensorial foi desenvolvida com intuito de avaliar a aceitação e as características sensoriais dos produtos e a intenção de compra. As figuras 3 e 4 explicitam os resultados da avaliação sensorial dos biscoitos, sendo apresentado o índice de aceitabilidade e a intenção de compra, respectivamente. As Figura 5 e 6 apresentam a aceitabilidade – Índice de Aceitação (%) e os percentuais de intenção de compra da barra de cereal elaborada.
A partir dos resultados obtidos com a análise sensorial do produto final, observa-se que o biscoito com adição do resíduo de goiaba atingiu índices de aceitabilidade satisfatórios, demonstrando que a aplicação do resíduo é uma alternativa viável para a utilização deste produto. Tal constatação se deve aos dados resultantes dos conjuntos avaliados, os quais apresentaram valores aproximados ou superiores a 70%, valor no qual é indicado por Teixeira (13) para que um produto seja considerado aceito, em termos de suas propriedades sensoriais.
A adição do resíduo não causou interferências expressivas nas características sensoriais do biscoito. O mesmo foi observado por Santana e colaboradores (14), ao constatar que de maneira geral, as concentrações de farinha de sementes de goiaba aplicadas nas formulações não interferiram desfavoravelmente na qualidade sensorial dos biscoitos elaborados.
Quanto aos valores referentes à intenção de compra do produto, os julgadores indicaram os resultados superiores a 30 e 50 % para os índices preenchidos “2-talvez comprasse” e “3-compraria”, respectivamente. O valor superior a 50% observado na intenção de compra justifica-se pela utilização de maior concentração de resíduo na formulação, diferente dos resultados obtidos por Uchôa Thomaz et al. (15) no estudo sobre a adição da semente de goiaba em pó, percebeu que os produtos elaborados com substituição de 5% de farinha de trigo pela semente de goiaba em pó, produto com menor concentração, apresentou uma melhor aceitação por parte dos avaliadores, constatando que os consumidores “provavelmente compraria”. Dessa forma, comprova-se que a utilização do resíduo na elaboração de alimentos promove uma maior aceitabilidade do produto.
A barra com resíduo de goiaba apresentou resultados satisfatórios na avaliação sensorial, visto que Melo Filho (16) em seu estudo com barras de cereais desenvolvidas acrescentando a farinha do resíduo agroindustrial da goiaba (FRAG) em 5 proporções (0%, 5%, 10%, 15% e 20%) sendo comparadas com uma marca comercial, obteve como resultados as barras de maior aceitação para aparência e odor a barra comercial e as formulações de 15 a 20%, para o atributo sabor, a amostra comercial mais se destacou. Segundo Dutcosky (12) a repercussão é favorável quando o índice de aceitabilidade for > 70%.
O produto elaborado não apresentou resposta negativa, ou seja, certamente não compraria, provando uma possibilidade de compra dos provadores a barra elaborada.
CONCLUSÕES
Diante dos resultados, verificou-se que a utilização da farinha mista na formulação de biscoitos viabiliza a aceitação do produto pelos consumidores, uma vez que os resultados obtidos para intenção de compra para a formulação do biscoito com resíduo foram superiores a 50 % referente a intenção compraria
A barra de cereal desenvolvida apresentou resultados satisfatórios em todos os atributos sensoriais avaliados, e não recebeu negativo na intenção de compra.
A incorporação do resíduo agroindustriais de goiaba na elaboração de produtos de cereais, biscoito e barra de cereal, vem a ser uma alternativa viável para a redução do impacto ambiental, além de proporcionar a redução de custos e o enriquecimento nutricional do produto, gerando uma boa aceitabilidade e podendo ser uma alternativa à dieta dos portadores da doença celíaca.
REFERÊNCIAS
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