CARACTERIZAÇÃO DE FATIAS DE MAMÃO-PASSA PRODUZIDAS PELO MÉTODO OSMO-SOLAR
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DOI: https://doi.org/10.53934/9786585062046-47
Este trabalho foi escrito por:
Marina Macêdo Fernandes; Aline Dias de Oliveira; Dyego da Costa Santos*; João Paulo de Lima Ferreira; Elisabete Piancó de Sousa; Raimunda Valdenice da Silva Freitas; Gustavo Santos de Lima
*Autor correspondente (Corresponding author) – Email: [email protected]
Resumo: O mamão é uma fruta bastante apreciada em todo o mundo em virtude de suas características nutritivas e sensoriais. Entretanto, o alto teor de umidade e a elevada atividade respiratória após a colheita aumentam a sua perecibilidade, tornando-se imprescindível a utilização de tecnologias que aumentem a vida útil de seus componentes, ao passo que possibilita o desenvolvimento de um novo alimento de valor agregado. Assim, objetivou-se processar mamão-passa pelo método osmo-solar e caracterizar os produtos desidratados quanto a parâmetros físicos e químicos. Fatias de mamão com dimensões de 4,5×2,0×0,5 cm foram desidratadas osmoticamente na temperatura de 30 °C por 12 h nas soluções hipertônicas de melado, mel de Apis mellifera e xaropes de sacarose, de açúcar mascavo e de glicose, seguido de secagem em secador solar construído em chapa zincada e revestido internamente com poliestireno expandido, até massa constante; também realizou-se a secagem solar de uma amostra sem tratamento, constituindo-se em controle. As fatias de mamão desidratadas pelo processo osmo-solar e a amostra controle foram caracterizadas quanto a parâmetros físicos e químicos. De acordo com os resultados, todas as características avaliadas foram significativamente alteradas (p<0,05) pelos agentes hipertônicos utilizados, em que a amostra pré-tratada com glicose deteve o menor valor de umidade, que é desejável em condições de armazenagem prolongada. Pesquisas adicionais fazem-se necessárias para quantificação de propriedades sensoriais, nutricionais e bioativas.
Palavras–chave: Carica papaya L.; controle de qualidade; desidratação osmótica; secagem solar; solução hipertônica
Abstract: Papaya is a fruit widely appreciated around the world due to its nutritional and sensory characteristics. However, the high moisture content and high respiratory activity after harvest increase its perishability, making it essential to use technologies that increase the useful life of its components, while enabling the development of a new value-added food. Thus, the objective was to process papaya using the osmo-solar method and to characterize the dehydrated products in terms of physical and chemical parameters. Papaya slices measuring 4.5×2.0×0.5 cm were osmotically dehydrated at 30 °C for 12 h in hypertonic solutions of molasses, Apis mellifera honey and sucrose, brown sugar and glucose, followed by drying in a solar dryer built in galvanized sheet and internally coated with expanded polystyrene, until constant mass; solar drying of an untreated sample was also performed, constituting a control. The papaya slices dehydrated by the osmoso-solar process and the control sample were characterized in terms of physical and chemical parameters. According to the results, all the characteristics evaluated were significantly altered (p<0.05) by the hypertonic agents used, in which the sample pre-treated with glucose had the lowest moisture value, which is desirable in conditions of prolonged storage. Additional research is needed to quantify sensory, nutritional and bioactive properties.
Keywords: Carica papaya L.; quality control; osmotic dehydration; solar drying; hypertonic solution
INTRODUÇÃO
O mamão (Carica papaya L.) é uma fruta amplamente distribuída e cultivada em países tropicais e subtropicais, sendo bastante consumida em todo o mundo (1), com produção mundial em 2019 estimada em 13,74 milhões de toneladas (2). Tan et al. (3) destacaram que essa fruta tem uma excelente aceitação no mercado global devido ao seu alto valor nutricional, com quantidades de calorias relativamente baixas e teores consideráveis de fibra dietética que contém enzimas digestivas e vitaminas a um preço razoável. Além disso, contém fenóis que atuam como bom antioxidante e excelente agente antimicrobiano, carotenoides, potássio (4), alcaloides, fenólicos e glucosinatos (2).
Apesar do mamão ser bastante apreciado, a sua alta perecibilidade tem sido um grande gargalo que deve ser superado no processo de produção e comercialização de frutas frescas (5). O mamão pode ser deteriorado durante a colheita, transporte, armazenamento e consumo (6) em virtude do seu alto teor de umidade, em torno de 80-85% (4), somada a alta taxa respiratória após a colheita (1). Nesse sentido, tecnologias de baixo custo, a exemplo das combinações entre as desidratações osmótica e solar, devem ser aplicadas com o intuito de preservação dos componentes da fruta, ao passo que o transforma em um novo produto de valor agregado.
A desidratação osmótica é um método simples que tem por finalidade remover parcialmente a água de frutas e hortaliças. Essa desidratação parcial é procedida mergulhando-se as partículas do material em uma solução aquosa concentrada, que pode ser a base de sacarose, glicose, melado de cana-de-açúcar, mel de abelhas, entre outros agentes hipertônicos. Esse processo é eficaz mesmo à temperatura ambiente e é geralmente utilizado como pré-tratamento antes do processo de secagem (7) que, por sua vez, é eficiente para remover o residual de umidade de frutas e hortaliças osmoticamente desidratas, aumentando a sua estabilidade em condições de estocagem prolongada. Isso se deve à redução da atividade de água, que promove desaceleração das atividades metabólicas que culminariam na depreciação do produto (8).
Muitos métodos foram desenvolvidos para remover o residual de água de produtos osmoticamente desidratados com a melhor qualidade, particularmente secagem por micro-ondas, liofilização, secagem a vácuo, secagem com ar quente, entre outros, sendo que a maioria desses secadores usa combustível fóssil ou eletricidade para produzir calor para secagem. Todavia, deve-se considerar que o esgotamento das reservas de energia levou à popularização da secagem solar de alimentos (4). De acordo com Santos et al. (9), esse tipo de secagem é uma alternativa simples e de baixo custo para a desidratação de frutas e hortaliças, principalmente para a agricultura familiar, visto que grande parte do Brasil apresenta condições ambientais favoráveis à secagem solar, pois se encontra em uma zona tropical com altos níveis de insolação e, em determinados períodos do ano, baixa umidade relativa do ar e pouca pluviosidade (9).
Considerando-se que a busca pelo desenvolvimento de métodos eficientes para aproveitar ao máximo o potencial das fontes renováveis de energia é a necessidade do momento (10), objetivou-se processar mamão-passa pelo método osmo-solar e caracterizar os produtos desidratados quanto a parâmetros físicos e químicos.
MATERIAL E MÉTODOS
O presente projeto foi desenvolvido no Laboratório de Agroindústria do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Acre (IFAC), Campus Xapuri. Foram utilizados mamões ‘Formosa’ provenientes de um pequeno produtor da cidade de Xapuri-AC, em estádio de maturação compreendendo a escala 2 da classificação proposta por Oliveira et al. (11), a saber fruta com até 25% da superfície da casca amarela, rodeada de verde-claro. Para elaboração dos agentes osmóticos desidratantes foram utilizados a sacarose comercial, o açúcar mascavo comercial, o xarope de glicose, a rapadura e o mel de abelha da espécie A. mellifera, ambos oriundos do comercio varejista de Xapuri-AC.
Os mamões e os insumos foram transportados ao laboratório, onde foram elaborados cinco agentes desidratantes com teores de sólidos solúveis totais (SST) padronizados em cerca de 56 °Brix. A rapadura, a sacarose e o açúcar mascavo foram dissolvidos em água destilada sob aquecimento brando em tacho aberto, para obtenção do melado de cana-de-açúcar e dos xaropes de sacarose e de açúcar mascavo com teores de SST pré-estabelecidos, os qual foram monitorados em refratômetro de bancada tipo Abbe. O mel (com teor de SST de 82 °Brix) e o xarope de glicose foram diluídos com água destilada sob agitação até equivalência dos SST com os demais desidratantes, a saber 56 °Brix. Os frutos foram lavados em água corrente, sanitizados em solução clorada (100 ppm por 15 min) e enxaguados em água corrente para remoção da solução sanitizante. Na sequência, foram descascados manualmente, cortados longitudinalmente e submetidos a remoção manual das sementes. Em seguida, foram cortados em fatias com dimensões aproximadas de 4,5×2,0×0,5 cm e submetidos a branqueamento químico por imersão em solução de ácido cítrico (4% m/m) e ácido ascórbico (1% m/m) por 1 min. Posteriormente, a solução foi drenada e a água superficial foi removida das fatias com uso de papel toalha absorvente. O mamão fatiado foi amostrado e submetido às análises de teor de umidade, sólidos totais, sólidos solúveis totais (SST), acidez total titulável (ATT) em ácido cítrico e pH segundo métodos analíticos do Instituto Adolfo Lutz (12), além da relação entre os SST e a ATT para mensurar a sensação de doçura.
As desidratações osmóticas foram conduzidas por 12 h sob pressão atmosférica, sem agitação, na temperatura de 30 °C em potes plásticos com capacidade para 1,5 L. Em cada pote foram adicionados as amostras e o agente desidratante na razão de 1:3 m/m, constituindo-se em cinco tratamentos. Decorridos o tempo da desidratação osmótica, foram removidos o excesso das soluções desidratantes com uso de jatos de água destilada seguido de adsorção da água com uso de papel absorvente. Em seguida, as amostras foram submetidas à desidratação solar complementar, em triplicata, em secador solar (13) construído com chapa de zinco em formato retangular, medindo 30 cm de largura, 50 cm de comprimento e 18 cm de profundidade. O secador solar era revestido internamente com poliestireno expandido pintado de cor escura, possuindo por cobertura um vidro transparente plano com 4 mm de espessura. As laterais do secador possuíam aberturas com diâmetros de 1,4 cm, para exaustão da umidade a ser perdida pelas amostras. O interior do secador ainda apresentava uma chapa de zinco plana (46,5×26,5 cm) posicionada sobre o poliestireno expandido e colorida de cor preta (Figura 1).
Cerca de 30 g das fatias de mamão desidratado osmoticamente foram espalhadas em bandejas de alumínio e direcionadas à secagem solar, em triplicata, no secador solar apresentado na Figura 1. Ainda foram desidratadas fatias de mamão não tratadas osmoticamente, constituindo-se em amostras controle. As secagens foram iniciadas aproximadamente às 8 h, com monitoramento da perda de massa das amostras através de pesagens em intervalos regulares de tempo, e quando as amostras atingiam o equilíbrio higroscópico com o ambiente, ou seja, quando não se registrava mais variação mássica, as secagens eram encerradas e as amostras acondicionadas em embalagens laminadas.
As fatias de mamão desidratadas pelo processo osmo-solar foram desintegradas com uso de almofariz e pistilo e avaliadas quanto aos parâmetros de teor de umidade, sólidos totais, sólidos solúveis totais, acidez total titulável em ácido cítrico, pH e relação SST/ATT segundo métodos já citados. Os dados da caracterização foram submetidos à análise de variância (ANOVA) e a comparação de médias foi feita pelo teste de Tukey a 5% de probabilidade, usando-se o programa computacional Assistat 7.7 pt.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Estão dispostos na Tabela 1 os resultados da caracterização física e química das fatias de mamão ‘Formosa’ processadas pelo método osmo-solar. O teor de umidade das fatias de mamão foi significativamente (p<0,05) afetada pelas condições de secagem osmo-solar. O conteúdo de água variou, em ordem decrescente conforme segue: polpa fresca > NAT (in natura) > XSA (xarope de sacarose) > MCA (melado de cana-de-açúcar) > XAM (xarope de açúcar mascavo) > ME (mel de A. melífera) > XGL (xarope de glicose). Um aumento estatisticamente significativo (p<0,05) no conteúdo de umidade, em comparação com a polpa de mamão fresca, pode ser observado para todos os tratamentos e, entre estes, apenas as fatias pré-desidratadas em xarope de açúcar mascavo e mel de A. mellifera não diferiram estatisticamente entre si. No presente estudo, o XGL permitiu uma maior redução no conteúdo de água, cerca de 80,08%, em relação ao produto fresco. Durante o pré-tratamento osmótico, ocorre saída de água do produto para a solução osmótica e, neste processo, também é observada a migração de sólidos para o produto, potencializado pela secagem em secador solar, que removeu o excedente de umidade do produto. Dessa forma, os resultados demostram que o xarope de glicose foi um meio desidratante eficiente, comparado aos demais tratamentos empregados. É interessante destacar que o produto seco sem qualquer pré-tratamento de desidratação osmótica (NAT), apresentou um conteúdo de umidade residual elevado (Tabela 1), reforçando a necessidade da pré-desidratação osmótica das fatias de mamão antes da secagem solar.
A polpa de mamão fresca (in natura) apresentou um conteúdo de sólidos totais de 9,45%, enquanto as fatias de mamão submetidas à secagem osmo-solar apresentaram o conteúdo de sólidos totais entre os limites de 74,62 e 81,96% (Tabela 1). As amostras apresentaram a seguinte classificação para sólidos totais em ordem decrescente, a saber: XGL > ME > XAM > MCA > XSA > NAT > polpa fresca. Pode-se notar que os maiores valores de sólidos totais ocorreram nas amostras submetidas à pré-desidratação osmótica, em relação à amostra sem tratamento osmótico. Obviamente, este resultado era esperado, pois o conteúdo de sólidos totais da amostra sem pré-tratamento é consequência da sua concentração devido à evaporação de umidade durante a secagem solar. Por outro lado, como discutido anteriormente, durante a desidratação osmótica, além da perda de água, também ocorre o ganho de sólidos, o que reflete no aumento do conteúdo de sólidos totais final pelas fatias de mamão. O aumento do conteúdo de sólidos, em comparação com o material fresco, também foi observado em estudo de Mota (14).
A polpa de mamão fresca apresentou teor de ácidos orgânicos e pH de 0,12% e 5,49, respectivamente, enquanto que as fatias de mamão após secagem solar, submetidas ou não a pré-desidratação osmótica, apresentaram teor de ácidos variando entre 0,15-0,44 e pH variando entre 5,18-5,59 (Tabela 1). As fatias de mamão apresentaram a seguinte classificação para a ATT, em ordem decrescente, conforme segue: XGL > MCA > ME > NAT > XSA > XAM > polpa fresca. O pH variou, em ordem decrescente, a saber: amostra fresca > XAM > XSA > MCA > NAT > ME > XGL. A partir da análise da Tabela 1, após a secagem solar, independente do pré-tratamento osmótico, houve o aumento na concentração de ácidos orgânicos (e, consequentemente redução no pH). O XGL permitiu uma maior retenção da concentração de ácidos orgânicos (com menor valor de pH) nas fatias de mamão, correspondendo a um aumento de cerca de 266,6% em relação a polpa de mamão fresca.
Na Tabela 1, o conteúdo de SST variou, em ordem decrescente como segue: XSA > XAM > ME > MCA > XGL > NAT > polpa fresca. Por outro lado, a ordem decrescente dos valores da relação SST/ATT nas fatias de mamão foi de: XMA > XSA > ME > NAT > MCA > XGL > polpa fresca. O conteúdo de sólidos solúveis totais e a relação SST/ATT das fatias de mamão foram significativamente maiores (p<0,05) nas amostras submetidas à secagem osmo-solar, em comparação com a polpa fresca e as fatias submetidas à secagem solar, mas sem tratamento de desidratação osmótica (NAT) (veja Tabela 1). O aumento dos sólidos solúveis totais pode ser devido, principalmente, a migração de soluto da solução osmótica para as fatias de mamão, enquanto que o aumento na relação SST/ATT foi causado pela maior proporção de sólidos nos constituintes das fatias, em comparação com a quantidade de ácidos orgânicos.
Têm-se na Figura 2 as ilustrações das fatias de mamão-passa produzidas pelo método osmo-solar. Percebeu-se que o agente hipertônico utilizado repercutiu em considerável alteração na cor dos produtos, em que as amostras XAM e MCA apresentaram-se perceptivelmente mais escuras que o restante das amostras. Pontua-se necessidade de estudos adicionais, com investigação de retenção de compostos bioativos, características mecânicas e sensoriais e estocagem em diferentes condições de armazenamento.
CONCLUSÕES
As características físicas e químicas do mamão-passa produzido pelo método osmo-solar são alteradas em função do agente hipertônico utilizado, em que a amostra pré-tratada com glicose detêm o menor valor de umidade, que é desejável em condições de armazenagem prolongada.
Sugerem-se testes adicionais, com a quantificação de compostos bioativos e determinação das características sensoriais, além de estudo de estabilidade durante o armazenamento em condições de comercialização.
AGRADECIMENTOS
Ao Instituto Federal do Acre (IFAC) pela concessão de bolsa de iniciação científica ao primeiro autor.
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