ROTULAGEM DE VEGETAIS MINIMAMENTE PROCESSADOS: AVALIAÇÃO DE CONFORMIDADES À LEGISLAÇÃO VIGENTE
Capítulo de livro publicado no livro do VIII ENAG E CITAG. Para acessa-lo clique aqui.
DOI: https://doi.org/10.53934/9786585062046-80
Este trabalho foi escrito por:
Carlos Roberto Marinho da Silva Filho*
*ORCID: https://orcid.org/0000-0001-8493-6129
Universidade Federal da Paraíba, Campus III, Bananeiras, Paraíba, Brasil.
Resumo:
Os vegetais minimamente processados (VMP’s) surgiram para atender a uma nova tendência de consumo e têm tido uma aceitação cada vez maior nos mercados mundiais. Sendo assim, a presente pesquisa teve como objetivo analisar a adequação dos rótulos de VMP’s comercializados na região metropolitana de João Pessoa, Paraíba, de acordo com as legislações vigentes. Foram analisados vinte e oito rótulos de sete marcas de vegetais minimamente processados. Os dados coletados foram confrontados com as RDC’s nº 259/2002, nº 360/2003, nº 359/2003, nº 429/2020 e a Instrução Normativa nº 75/2020, todas da Agência de Vigilância Sanitária, além da Lei nº 10.674/2003. Independentemente da marca e do tipo de vegetal minimamente processado, os dezoito rótulos que, voluntariamente, apresentavam a rotulagem nutricional, estavam adequados com as seguintes legislações: Resolução RDC nº 360/2003 e Resolução nº RDC 359/2003. A infração mais cometida foi quanto à obrigatoriedade adequada, e informativa, sobre a presença de glúten, preconizada pela Lei nº 10.674/2003, e desconforme em treze rótulos. Considerando-se ainda a obrigatoriedade das informações descritas nas legislações vigentes, questiona-se o compromisso por parte da indústria de alimentos na apresentação dos rótulos, já que os resultados desse estudo demonstraram que 46,4% dos produtos analisados não atendem ao propósito disposto pela Lei nº 10.674/03. O trabalho trouxe à tona um problema bastante preocupante com relação à segurança alimentar dos consumidores portadores da doença celíaca.
Palavras-chave: frutas minimamente processadas; hortaliças minimamente processadas; rotulagem
Abstract:
Minimally processed vegetables (MPV’s) emerged to meet a new consumer trend and have had an increasing acceptance in world markets. Therefore, the present research aimed to analyze the suitability of VMP’s labels marketed in the metropolitan region of João Pessoa, Paraíba, according to current legislation. Twenty-eight labels of seven brands of minimally processed vegetables were analyzed. The collected data were compared with RDC’s nº 259/2002, nº 360/2003, nº 359/2003, nº 429/2020 and Normative Instruction nº 75/2020, all of the Health Surveillance Agency, in addition to Law nº 10.674/2003. Regardless of the brand and type of minimally processed vegetable, the eighteen labels that voluntarily presented nutritional labeling were in compliance with the following legislation: Resolution RDC nº 360/2003 and Resolution RDC nº 359/2003. The most committed infraction was regarding the adequate and informative obligation on the presence of gluten, recommended by Law nº 10.674/2003, which does not comply with thirteen labels. Considering the mandatory information described in the current legislation, the commitment of the food industry in the presentation of labels is questioned, since the results of this study showed that 46.4% of the analyzed products do not meet the purpose set forth by the Law nº 10.674/2003. The work brought to light a very worrying problem with regard to food safety for consumers with celiac disease.
Keywords: labeling; minimally processed fruits; minimally processed vegetables
INTRODUÇÃO
Novos hábitos e percepções do mercado consumidor têm contribuído para o aumento do consumo de frutas e hortaliças. Estes produtos, caracterizados pelo elevado valor nutricional, têm ido de encontro aos anseios dos consumidores, cada vez mais preocupados com aspectos relacionados à saúde e ao bem-estar1. Além disso, a expansão da urbanização e da vida moderna, bem como a falta de tempo para o preparo dos alimentos são razões que estimulam a busca do consumidor por produtos saudáveis, práticos e prontos para o consumo, como é o caso dos vegetais minimamente processados (VMP’s). A crescente expansão dos VMP’s resultou em um novo perfil de consumidor definido como “rico em dinheiro/pobre em tempo”2.
Produtos rotulados como minimamente processados estão fortemente associados ao conceito de alimento pronto para o consumo direto, similar ao in natura e são oferecidos ao consumidor já embalados3. O processamento mínimo envolve operações de limpeza, lavagem, descascamento, corte, embalagem e armazenamento, e apresentam qualidade semelhante à do produto fresco. Devido à sua praticidade, possuem ótimo potencial de comércio, por serem alimentos naturais, de alta qualidade e adequadas condições higiênicas, para o consumo seguro da população4. Atualmente, pesquisadores e a indústria vêm trabalhando em novas tecnologias, com a finalidade de garantir a qualidade sanitária e sensorial dos alimentos, e também para diminuir impactos ao meio ambiente4.
Atrelado ao contexto acima, os aspetos sociais da alimentação estão relacionados com diversos fatores e áreas de conhecimento, e impactam, de maneira direta, nas políticas de saúde para a população. Nesse contexto, especial destaque merece o fato de que o conhecimento sobre os alimentos que são consumidos pela população é comunicado, via de regra, por meio dos rótulos e embalagens, que misturam elementos propagandísticos com alegadas informações nutricionais e de saúde5.
A rotulagem geral e nutricional de alimentos embalados é regulamentada pela legislação brasileira através de órgãos como o Ministério da Saúde por meio da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), o Ministério da Agricultura e o Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (INMETRO). De maneira geral, a ANVISA é a principal responsável pela regulamentação do tema, observando a competência legal de outros órgãos no assunto. Este processo de regulamentação contribuiu para que o Brasil fosse o primeiro país no bloco econômico MERCOSUL a ter a rotulagem nutricional obrigatória, facilitando o comércio entre os países do bloco6.
A rotulagem de alimentos (geral e nutricional) tem extrema importância e serve para informar o consumidor sobre as propriedades nutricionais dos produtos alimentícios, auxiliando-o na escolha dos alimentos de forma adequada, considerando a necessidade constante de controle sanitário e proteção da saúde da população, e complementando estratégias e políticas de saúde em benefício da saúde do indivíduo7.
A rotulagem geral serve para auxiliar as pessoas na identificação dos produtos, como as características do produto, dados do fabricante, prazo de validade e o número do lote que facilita a rastreabilidade do produto. Já a rotulagem nutricional, é o que diz respeito as informações que constam na tabela nutricional, presente na embalagem e oferecem a oportunidade para o consumidor conhecer a composição do alimento, como a quantidade de gorduras saturadas, se tem ou não gorduras trans, por exemplo. Esta informação é essencial para indivíduos que querem consumir alimentos com determinados nutrientes ou para aquelas pessoas que possuem alergia ou intolerância a algum componente do produto. Na lista de ingredientes, também se declara os aditivos que foram utilizados no preparo, como os conservantes, corantes, edulcorantes e outras substâncias que possam ser empregadas para modificar as características químicas, físicas, biológicas ou sensoriais do alimento8.
As advertências, que também são obrigatórias, auxiliam o consumidor a identificar substâncias como por exemplo, ovos, amendoim, soja, lactose e glúten, presentes no alimento e que podem prejudicar sua dieta ou ainda ser prejudicial às pessoas que apresentem alguma das mais variadas formas de restrição alimentar, seja por intolerâncias, alergias ou por 15 doenças, como diabetes8. A legislação brasileira, além de determinar as informações obrigatórias, também define o que é proibido nos rótulos dos produtos alimentícios. São proibidas informações e expressões que possam enganar, ou ainda, fazer o consumidor considerar que determinado alimento seja capaz de, por exemplo, dar mais energia, melhorar desempenho físico ou de prevenir e/ ou tratar doenças9.
O Brasil foi um dos primeiros países a adotar a rotulagem geral e nutricional obrigatória como parte de uma estratégia de saúde pública. As primeiras leis foram publicadas na década de 60, como o Decreto-Lei n° 986 de 1969, ainda vigente, que estabelece as normas básicas sobre alimentos. Ela foi publicada no Diário Oficial da União (DOU) e define uma série de definições e procedimentos para produtos alimentícios embalados no Brasil, abrangendo desde os critérios de fabricação, fiscalização, rotulagem, entre outros. Este regulamento técnico se aplica à rotulagem de todo produto alimentar que seja comercializado e embalado na ausência do cliente10.
Dentre as principais leis sobre rotulagem alimentar vigentes no país, encontra-se a Resolução – RDC n° 259/0211, a qual determina que todo alimento embalado comercializado no país deva conter no rótulo, obrigatoriamente, as seguintes informações: denominação de venda do alimento; lista de ingredientes; conteúdo líquido; identificação da origem; identificação do lote e prazo de validade; modo de conservação; instrução sobre o preparo e uso do alimento, quando necessário; e a identificação do importador para alimentos importados11. Outra norma muito importante é a Resolução – RDC n° 360/0312 que tornou obrigatória a rotulagem nutricional desde 31/07/06. A partir desta data, o valor energético e o de nutrientes (carboidratos, proteínas, gorduras totais, saturadas, gorduras trans, fibra alimentar e sódio) tiveram que ser declarados no rótulo. Ademais, vitaminas e minerais podem ser declarados opcionalmente, desde que cada porção do alimento contenha pelo menos 5% da ingestão diária recomendada (IDR)12. Já a Resolução – RDC n° 359/0313 estabelece que a informação nutricional deve ser expressa por porção, incluindo a sua medida caseira correspondente13.
Visando melhorar a forma de declaração das informações nutricionais nos rótulos dos alimentos foi realizada uma revisão da legislação para aprimorar as regras para declaração da rotulagem nutricional, com o objetivo de facilitar sua compreensão pelos consumidores brasileiros. As alterações foram realizadas com intuito de aperfeiçoar a visibilidade e a legibilidade das informações nutricionais, com redução das situações que geram engano quanto à composição nutricional, facilitando a comparação nutricional entre alimentos14. Assim, no dia 08 de outubro de 2020 foram publicadas a RDC nº 429/2015 que dispõe sobre a rotulagem nutricional dos alimentos embalados, e a Instrução Normativa IN nº 7516 que se aplica de forma complementar a RDC nº 429/20 e estabelece os requisitos técnicos para declaração da rotulagem nutricional nos alimentos embalados. As novas normas definem a rotulagem nutricional de forma mais especifica e compreensível, sendo ela toda uma declaração destinada a informar ao consumidor as propriedades nutricionais do alimento, compreendendo a tabela de informação nutricional, a rotulagem nutricional frontal e as alegações nutricionais15,16.
A RDC nº 429/20 estabelece que a declaração da tabela de informação nutricional e obrigatória nos rótulos dos alimentos embalados na ausência dos consumidores, incluindo as bebidas, os ingredientes, os aditivos alimentares e os coadjuvantes de tecnologia, inclusive aqueles destinados exclusivamente ao processamento industrial ou aos serviços de alimentação. Esta resolução também determina o que deve constar na tabela de informação nutricional como a quantidade de valor energético (expresso em kcal), carboidratos (g), açúcares totais (g), açúcares adicionados (g), proteínas (g), gorduras totais (g), gorduras saturadas (g), gorduras trans (g), fibra alimentar (g), sódio (mg) e ainda qualquer outro nutriente ou substancia que possa ser objeto de alegações de propriedades nutricionais, funcionais ou de benefícios a saúde. Nota-se que são mantidas todas as informações nutricionais estabelecidas pela RDC nº 360/03, mas agora com a incorporação dos itens açúcares totais e açúcares adicionados12,15. A RDC nº 429/2015 e a IN nº 75/2016 entram em vigor quando passados 24 meses de suas publicações, ou seja, outubro de 2022. A ANVISA afirma que estes prazos são adequados e necessários para que o setor de produção de alimentos realize os ajustes e tempo suficiente para estruturar a fiscalização.
A Lei Federal nº 10.674 de 200317 trouxe a obrigação de constar a informação no rótulo do produto alimentício industrializado se o mesmo contém ou não contém glúten. Por glúten, entende-se uma mistura de proteínas presentes em alguns grãos de cereais, tais como o trigo, o centeio, a cevada e a aveia. A motivação para a existência da mencionada Lei é o crescente número de pessoas diagnosticadas com a doença celíaca, causada pelo consumo de glúten, de natureza autoimune, que se caracteriza pela reação inflamatória crônica no intestino delgado que dificulta a absorção de nutrientes18. As pessoas nessa condição, portanto, não devem nunca consumir alimentos que contenham o glúten por se tratar de doença crônica e permanente18.
A adequação das informações obrigatórias nos rótulos de vegetais minimamente processados é de suma importância por estes serem consumidos e aceitos por pessoas de todas as idades. Além da garantia de um produto com condições higiênico-sanitárias satisfatórias, a verificação da conformidade dos dizeres da rotulagem é obrigatória por se tratar de um alimento embalado na ausência do consumidor e pronto para a comercialização. O rótulo deve ser fiel ao produto e ser escrito de forma clara e legível, não induzindo a equívocos, além de conter todas as informações previstas na legislação. O direito a tais informações também está previsto no Código de Defesa do Consumidor (CDC) – Lei nº 8.078/1990 (BRASIL, 1990)19.
Devido ao aumento de consumo desse produto no Brasil e a escassez de trabalhos que relatem a adequação das rotulagens frente às legislações, este trabalho objetiva verificar a conformidade dos dizeres da rotulagem das embalagens de frutas e hortaliças minimamente processadas, comercializadas na região metropolitana de João Pessoa, Paraíba.
MATERIAL E MÉTODOS
Este estudo de abordagem descritiva e quantitativa foi realizado no período de junho a setembro de 2022 na região metropolitana de João Pessoa, Paraíba. Os critérios adotados para a amostragem foi o acesso livre e intencional.Foram coletados todos os vegetais minimamente processados que, apesar de modificados fisicamente, mantinham as características de frescor de produtos in natura e que não necessitavam, muitas vezes, de preparo subsequente antes do consumo.
Vinte e oito produtos diferentes foram encontrados (12 hortaliças minimamente processadas: alface, repolho, beterraba, cenoura, acelga, batata inglesa, mandioca, cheiro verde, pimentão, chuchu, couve e abóbora; e 16 frutas minimamente processadas: maçã, banana, pera, pêssego, caqui, kiwi, uva, morango, melão, mamão, melancia, laranja, tangerina, goiaba, abacate e manga) em um grupo de sete marcas.Os vegetais estavam acondicionados em bandejas de poliestireno expandido, envolto por filme de polietileno, e armazenados em balcões refrigerados sem termômetro ou sobre gelo, em supermercados da região metropolitana de João Pessoa, Paraíba.
Após a coleta, os dados foram duplamente digitados para um banco de dados, criado por meio do Programa EpiInfo 6.04 para posterior comparação com a legislação vigente de rotulagem alimentar (ver Tabela 1). Já a Tabela 2 descreve o questionário utilizado para verificação da conformidade dos rótulos analisados, conforme os critérios de legislação. Na análise estatística, os dados foram tratados por meio da estatística descritiva.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Considerando os 28 rótulos analisados, 13 rótulos apresentaram no mínimo um tipo de não conformidade frente à legislação, o que representa 46,4% dos rótulos analisados. Quinze rótulos estavam plenamente de acordo com a legislação e, portanto, apenas 53,6% dos rótulos analisados atendem ao estabelecido na legislação brasileira.
Preconiza a legislação vigente11 que todos os rótulos de alimentos embalados devem constar obrigatoriamente a denominação de venda do produto, ou seja, “o nome específico e não genérico que indica a verdadeira natureza e as características do alimento, que é fixado no Regulamento Técnico específico que estabelece os padrões de identidade e qualidade inerentes ao produto”. Assim, com relação ao item “Denominação de venda”, todas as amostras estavam regulares (28/28) e constavam a denominação do vegetal minimamente processado expressa em sua embalagem conforme a Resolução RDC nº 259/02 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária.
Considerando ainda a matéria legislada na RDC nº 259/0211, observou-se que todas as marcas indicavam a informação sobre o conteúdo líquido. A ausência das informações sobre “identificação de origem” e “identificação de lote” foi uma irregularidade observada em 7,14% (2/28) e 10,7% (3/28) das amostras, respectivamente. A legislação caracteriza como origem do produto o nome do fabricante, endereço, país de origem e município. Pela legislação os rótulos devem apresentar obrigatoriamente a identificação de origem do produto, que deve constar: “o nome (razão social) do fabricante ou produtor ou fracionador ou titular (proprietário) da marca; endereço completo; país de origem e município; número de registro ou código de identificação do estabelecimento fabricante junto ao órgão competente”.
Já a identificação do lote é importante para facilitar a rastreabilidade do produto, caso ocorram quaisquer problemas que tornem necessário o recolhimento dos mesmos. Ele deve ser indicado de forma legível e em local de fácil visualização, com um código chave precedido da letra “L”. O lote pode ser expresso também com a data de fabricação, a data da embalagem ou do prazo de validade, sempre que a (s) mesma (s) indique (m), pelo menos, o dia e o mês, ou o mês e o ano, (nesta ordem). Em nosso estudo, na maioria das vezes (25/28), no local indicado na embalagem para a informação sobre o lote foi encontrada a data de validade.
Trabalhando com matérias-primas diferentes das utilizadas em nosso estudo, Carneiro et al.20 avaliaram amostras de néctares relatando que apenas 43% das amostras analisadas informaram o conteúdo líquido e o lote de fabricação. Outros autores encontraram valores maiores que o do presente estudo. Grandi e Rossi21 não localizaram a identificação do lote em 16% de rótulos de iogurtes e em 25% de rótulos de bebidas lácteas fermentadas. Já Pereira et al.22 relataram tal irregularidade em 16% dos rótulos de barras de cereais e pães light, valor maior do que no presente estudo.
De acordo com a RDC nº 259/2002, as frutas e hortaliças frescas não têm a obrigatoriedade de exibir a data de vencimento. Observou-se neste estudo que, mesmo diante do contexto de declaração facultativa, 100% (28/28) dos rótulos analisados apresentaram as datas de validade. Dada a importância desse item de verificação, Cavada et al.23 encontraram um percentual de 69,54% entre os consumidores que verificavam o prazo de validade. De acordo com o estudo realizado por estes autores, ao serem questionados sobre o objetivo da consulta aos rótulos, a maioria dos entrevistados preocupava-se com o prazo de validade, seguido do interesse em saber a quantidade de nutrientes.
A falta de informação a respeito da data de fabricação também foi uma inconformidade relatada por Silva et al.24, que após analisar 38 embalagens de diferentes marcas de feijão encontrados nas prateleiras de mercados, encontrou inconformidade em 21% (8 dos 38 produtos analisados) delas. A informação completa quanto ao prazo de validade é de fundamental importância para que o consumidor possa adquirir um produto, pois segundo Nascimento et al.25, é esta a informação que o consumidor lê com major frequência, seguida da leitura das informações nutricionais e a lista de ingredientes.
Garcia et al.26 observaram como é comum em rótulos de alimentos no Brasil o pouco destaque dado ao espaço e localização de informações importantes como ingredientes, recomendações, data de fabricação e validade em detrimento às propagandas do produto.
Com relação às instruções de armazenamento dos produtos, 10,7% dos rótulos (3/28) não informavam as temperaturas máximas e mínimas sob as quais os vegetais deveriam permanecer estocados, fato que pode induzir o consumidor a manter o alimento sob condições inadequadas, acarretando deterioração ou proliferação de microrganismos patogênicos. A informação sobre a forma de conservação dos alimentos nos rótulos é de suma importância para informar aos consumidores a forma correta de conservar a qualidade dos VMP’s. Temperaturas fora do estabelecido pelo fabricante podem alterar caraterísticas sensoriais, químicas e principalmente microbiológicas, acarretando riscos à saúde dos consumidores.
Uma pesquisa realizada por Prado et al.27 observou-se que 97,1% dos rótulos de hortaliças minimamente processadas comercializadas no município de Ribeirão Preto, SP/Brasil, estavam em desacordo quanto à apresentação das informações obrigatórias preconizadas pela Resolução RDC nº 259/2002, da ANVISA. Foi detectado, por exemplo, um rótulo (1,4%) que não apresentava o modo de conservação, que nesse caso seria a recomendação da manutenção das hortaliças em refrigeração.
Ainda em vigência durante a execução desta pesquisa, a rotulagem nutricional dos alimentos embalados na ausência dos consumidores, deve obedecer aos preceitos das Resoluções RDC nº 360/200312 e a RDC nº 359/200313. Após a data de 08 de outubro de 2022, ambas as resoluções são revogadas e substituídas integralmente pela Resolução RDC nº 429/202015 que entra em vigor. Na redação da RDC nº 360/200312 (ainda vigente na data de escrita deste trabalho), apenas alguns tipos de alimentos não têm a obrigatoriedade de exibir a rotulagem nutricional, como as frutas, vegetais e carnes in natura, refrigerados e congelados, as bebidas alcoólicas, as especiarias, as águas minerais naturais. Diante de tal resolução os vegetais minimamente processados são produtos dispensados da apresentação de rotulagem nutricional. No entanto, verificou-se que, mesmo diante da não obrigatoriedade, dezoito rótulos dos vegetais minimamente processados analisados (64,3%) apresentavam a rotulagem nutricional e em conformidade, atendendo aos requisitos exigidos pela legislação vigente.
De forma semelhante, pelo preconizado pela RDC nº 359/200313, na rotulagem de vegetais minimamente processados não é obrigatório o estabelecimento dos tamanhos das porções dos alimentos embalados para fins de rotulagem nutricional. Nesse caso a porção é a quantidade média do alimento que deveria ser consumida por pessoas sadias, maiores de 36 meses de idade em cada ocasião de consumo, com a finalidade de promover uma alimentação saudável. Mesmo diante da não obrigatoriedade perante a legislação brasileira vigente13, dezoito rótulos analisados (64,3%) apresentavam os tamanhos das porções dos vegetais embalados para fins de rotulagem nutricional.
Foram avaliados os itens que devem constar obrigatoriamente no rótulo nutricional, a partir disso, pode-se inferir que todas as amostras se mostraram de acordo com os padrões estabelecidos12,13 no que diz respeito a medida caseira, a porção do produto, o valor energético (quilocalorias e quilojoules), as quantidades (gramas ou miligramas) de nutrientes como proteínas, carboidratos, gorduras (totais, saturadas e trans), fibras alimentares e sódio, assim como o percentual de valores diários de referência (%VD), os elementos seguiram corretamente as medidas, porcentagens e localização adequadas. Silva Filho e colaboradores28, avaliando onze rótulos de embalagens de vegetais minimamente processados comercializados na região metropolitana de João Pessoa/Paraíba, observaram que 63,3% apresentavam os tamanhos das porções dos vegetais embalados para fins de rotulagem nutricional. Já Garcia29 em sua pesquisa de rotulagem de alimentos constatou 36,2% de inadequações nas informações obrigatórias estabelecidas pelas RDC n° 259, 359 e 360 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Dentre estas inadequações estavam a ausência de porção alimentar (em g ou mL) e a medida caseira correspondente; além da tabela de informação nutricional de forma incompleta, em 1,1% dos rótulos avaliados.
De acordo com o Anexo I da Instrução Normativa nº 75/2016, instrução que se aplica de maneira complementar à Resolução de Diretoria Colegiada – RDC nº 429, de 8 de outubro de 202015, os vegetais minimamente processados entram na lista dos alimentos cuja declaração da tabela de informação nutricional é voluntária. No entanto, como descrito anteriormente, apesar do contexto voluntário, dos vinte e oito rótulos analisados, dezoito apresentavam a rotulagem nutricional e, neste caso, sete (7/18) em desconformidades (38,9%), não atendendo aos requisitos exigidos por esta legislação15.
Por meio deste resultado constatou-se que 38,9% dos rótulos que apresentavam rotulagem nutricional ainda devem se adequar à nova legislação no tocante à declaração das quantidades de nutrientes, aplicação das regras de arredondamento para expressão das quantidades de nutrientes, informação das quantidades de nutrientes por 100g do produto, informação da quantidade de porções unitárias contidas na embalagem e nota de rodapé na tabela com a frase “*Percentual de valores diários fornecidos pela porção”. Além do resultado de não-conformidades descritos em relação ao preconizado pela nova legislação RDC nº 429/2015, outras não-conformidades importantes puderam ser destacadas na rotulagem nutricional: Cinco rótulos (5/18 ou 27,8%) estavam não conformes no que se refere à coloração dos caracteres e das linhas que compõem a tabela de informação nutricional. De acordo com o Art. 16, inciso I da RDC 429/202015, a tabela de informação nutricional deve empregar caracteres e linhas de cor 100% preta aplicados em fundo branco. O mesmo percentual de não-conformidades foi verificado por não possuírem as informações de açúcares totais e açúcares adicionados, não possuírem os arredondamentos e não aplicarem a declaração de rotulagem frontal.
De acordo com Silva et al.30, o acesso à informação correta sobre o conteúdo nutricional dos alimentos integra o direito à alimentação, por constituir-se em elemento que contribui para a adoção de práticas alimentares e estilos de vida saudáveis, configurando-se, em seu conjunto, uma questão de segurança alimentar e nutricional.
Contraditoriamente, Bendino et al.31 observaram que os consumidores atribuem maior importância à marca e ao preço do produto, pois, por várias vezes, durante a pesquisa, isso foi comentado pelos entrevistados. No estudo desses autores, mais da metade dos entrevistados não deixaria de comprar um alimento após a leitura das informações nutricionais.
Por fim, na presente pesquisa, nove rótulos (32,1%) não apresentavam a expressão “não contém glúten” e em quatro (14,3%) esta expressão estava sem destaque, ambos os casos em desacordo com a legislação em vigor, totalizando 46,4% de não-conformidades. A Lei Federal nº 10.674/0317 tornou obrigatória à apresentação na rotulagem das expressões “contém glúten” ou “não contém glúten”, em caracteres com destaque, nítidos e de fácil leitura, como medida de prevenção da doença celíaca. Esta inadequação acerca da rotulagem é preocupante, uma vez que o glúten é prejudicial aos portadores da patologia supracitada, que consiste em uma intolerância permanente a essa proteína do trigo. A doença celíaca caracteriza-se pela intolerância permanente ao glúten, uma proteína encontrada em alguns cereais como trigo, cevada, centeio, malte e aveia.
CONCLUSÕES
As desconformidades observadas nos resultados desta pesquisa, revelam a necessidade de adequação da indústria alimentícia às legislações vigentes, fazendo com que as informações sejam claras e precisas para melhor entendimento do consumidor. Embora a nova legislação sobre rotulagem nutricional, RDC nº 429/2020, já tenha sido aprovada e vise facilitar a compreensão do consumidor, transmitindo de forma simplificada as principais informações nutricionais, faz-se necessário que os órgãos competentes fiscalizem para que tais informações sejam apresentadas de maneiras satisfatórias ao consumidor, uma vez que a análise da rotulagem realizada nos vegetais minimamente processados comercializados na região metropolitana de João Pessoa, reportou que 38,9% dos rótulos apresentavam algum problema na informação nutricional. O trabalho trouxe ainda à tona um problema bastante preocupante com relação à segurança alimentar dos consumidores portadores da doença celíaca.
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